O escritório de advocacia Lange, Maldonado & Gahyva, de Cuiabá, está elaborando uma série de artigos a respeito da Lei 12.619, a Lei do Descanso. O objetivo das advogadas Luciane Anretta Maldonado e Samantha Rondon Gahyva Martins é orientar os empregadores a respeito do tema, evitando demandas judiciais.

A Revista Carga Pesada vai publicar os artigos. Eles abordam somente os aspectos da lei relativos aos caminhoneiros empregados. A parte que trata dos autônomos não é discutida nos textos.

No primeiro artigo, que segue abaixo, o escritório lembra que, mesmo antes da 12.619, a Justiça do Mato Grosso considera que a jornada de trabalho dos motoristas deve ser observada pelo empregador.

 I.   Vigência, necessidade de controle e intervalo

Como sabemos a Lei Federal   nº.  12.619/12 regulamentou a  profissão  de  motorista profissional alterando a CLT e o Código Brasileiro de Trânsito. Muito se tem discutido sobre o tema e percebemos alguns  enganos,  inclusive,  alardeados  pela  mídia  nacional.  Prestamos consultoria trabalhista  preventiva  e  percebemos  também  algumas  dúvidas  recorrentes  dos  empregadores  do setor  de  transporte  de  cargas.  Publicaremos uma  série  de  artigos  destinados  ao  empresário  desse setor, em vocabulário não jurídico, esclarecendo a norma, e possibilitando as empresas planejar sua atividade de acordo com a Lei,  evitando assim, dissabores na Justiça do Trabalho.

Antes de entrar no  tema  em  si,  precisamos  dar  um  alerta:  a  nova  Lei  provocou  muitas divergências  no  meio  jurídico,  o  que  dificulta  sua  aplicação  com  segurança. Ainda levará  alguns anos  para  que  a  cúpula  do  Poder  Judiciário  (STF  e  TST)  se  pronuncie  sobre  a  lei  e  defina  com  a certeza necessária os contornos da mesma. Mas desde já, é possível traçar um norte sobre a matéria. 

 O primeiro  erro  que  notamos  tange  a  vigência  das  normas  trabalhistas.  Vigência é  a qualidade da norma que obriga sua observância.  Os meios de comunicação têm alardeado que a Lei nº. 12619/12 teve sua vigência prorrogada, ou seja, que por enquanto, ela não obrigaria. Isso porque a Resolução  do  Contran  nº.  408/2012 teria  concedido  novo  prazo  para  o  empresário  se reestruturar e a partir daí, cumprir a lei.

Na  verdade,  as  “novidades  trabalhistas”  da  Lei  nº.  12619/12  se  tornaram  obrigatórias  em 17/07/2012, data que a própria lei previu para se tornar obrigatória. A falácia noticiada tem origem na  Resolução  nº.  405  do Contran,  que  regulamentou  o  art.  67A  do  CTB  (norma  de  trânsito destinada  aos  motoristas).    Frisa-se:  a  normativa  veio  regulamentar  apenas  o  art.  67 A  do  CTB  e nem  mais  outra  norma  do  CTB  e  ou  da  CLT.  Tal Resolução  previa  que  a  fiscalização  meramente educativa  ocorreria  até  o  final  de  julho  de  2012. 

Ocorre,  porém  que  o  Contran  editou  nova Resolução,  prorrogando  o  início  da  fiscalização  punitiva  (no  que  tange  especificamente  ao cumprimento  do  art.  67 A  do  CTB)  até  11/09/2012. Assim,  além  desse  tempo  já  ter  se  esgotado, temos que a prorrogação tangia apenas a duração da fiscalização chamada também pedagógica (que precede a punitiva).  Em outras palavras, após a publicação da Resolução 408/2012, as autoridades de trânsito  não  poderiam  multar  o  caminhoneiro  até  11/09/2012  apenas  os  orientando  a  cumprir  o CTB.  Agora, isso não significa que todas as  “novidades trabalhistas” trazidas pela lei não estejam obrigando  a  empresa  transportadora.   

Esta está,  por  exemplo,  desde  17/07/2012,  obrigada  a conceder  descanso  a  cada  quatro  horas  de  direção  entre  outros.    A uma,  porque  a  Resolução  do Contran não  poderia  limitar  a  vigência  da  lei  no  tempo.  A duas,  porque  a  Lei  traz  normas trabalhistas  e  de  trânsito  e  o  Contran  não  tem  atribuição  para  regulamentar  as  primeiras.  Por fim, ainda temos que o Contran não pode inovar no ordenamento jurídico, criando direitos ou deveres. Por todas essas razões, e mais algumas outras, temos que nada impede, por exemplo, que o auditor fiscal do trabalho, aplique multa a empresa que descumprir a regra trabalhista.  

Passemos agora para o segundo tema desse artigo.

No Mato Grosso, já faz algum tempo que o motorista rodoviário, salvo raríssimas exceções, não  é  mais  considerado  empregado  externo,  nos  termos  do  art.  62,  I  da  CLT.  Esse  último  é  o trabalhador que por ser impossível o controle de sua jornada, não tem direito a horas extras. Nesse sentido, juízes  e  desembargadores  do  TRT  da  23ª  Região,  em  reiterados  julgados,  vem  pontuando que  é  possível  sim  controlar  a  jornada  do  motorista  empregado,    fazendo  uso,  por  exemplo,  de tacógrafos  e  outros  instrumentos  para  aferir  a  jornada,  o  que,  consequentemente,  tem  gerado condenação  das  empresas  transportadoras  a  pagar  vultuosas  quantias  aos  ex-empregados. 

Sem adentrar  ao  mérito  dessas  condenações  (até  mesmo  porque  assistimos  erros  crassos  de  alguns advogados  patronais  que  desconhecem  o  cerne  do  debate),  temos  que  a  obrigação  de  controlar  a jornada desses empregados, em nosso Estado, não é propriamente uma novidade. 

Nesse mesmo sentido, a Lei prevê a obrigação de fornecimento das fichas ou papeletas pelos empregadores,  cabendo  aos  motoristas  preenchê-las  com  as  informações  sobre  a  hora  de  saída, chegada,  quilometragem  e  local  de  origem  e  destino.  Tais  informações  deverão  ser  idênticas  aos dados do tacógrafo. Salienta-se que, a tolerância para as diferenças entre a planilha e o tacógrafo é de  no  máximo  2  minutos  a  cada  24  horas  e  de  10  minutos  a  cada  sete  dias,  conforme  disposto  na Resolução. 

 Mas avancemos.

 O disciplinamento  da  jornada  de  trabalho  é  o  principal  tema  abordado  pela  Lei.  Ela distingue, por exemplo, tempo de direção e jornada de trabalho. Jornada de trabalho é o lapso diário de tempo em que o empregado fica a disposição do empregador. Ela é composta de tempo efetivo de trabalho;  tempo  à  disposição;  tempo  in  itinere;  intervalos  remunerados,  e  outras  figuras  especiais como  o  sobreaviso.  Tempo  de  direção  é  o  lapso  de  tempo  em  que  o  motorista  está  efetivamente trabalhando.  Daí, já  deu  para  perceber,  que  o  tempo  de  direção  é  apenas  um  dos  componentes  da jornada de trabalho.

A  Lei  prevê  alguns  limites  para  o  tempo  de  direção  em  viagens  consideradas  de  longa distância,  ou  seja,  aquelas  que  o  motorista  se  ausenta  de  sua  base  mais  de  24  horas.  Segundo  a própria Lei, esse limite que é aplicável tanto aos empregados, quanto as autônomos, deve ser de, no máximo,  4  horas  de  direção  ininterrupta. Após  esse  período,  o  motorista  deverá  descansar  por  30 minutos,  sendo  que  estes  poderão  ser  fracionados  em  até  três  paradas  de  10  minutos.  Ou  seja,  a própria  Lei  previu  a  possibilidade  de  flexibilização  do  descanso  em  até,  no  máximo,  três  períodos de 10 minutos. Se o motorista não parar pelos 30 minutos corridos, ou dividir esse tempo em mais que  três  paradas,  há  violação  a  norma,  e,  portanto,  ato  gerará  efeitos  tanto  para  empregados  como para empregadores.

O empregado está sujeito à multa de trânsito por infração grave devendo ser atribuído cinco pontos  na  sua  CNH.  O  veículo  ainda  pode  ser  retido,  e  caso  não  haja  outro  motorista  junto  que possa  seguir  viagem,  até  que  o  período  de  descanso  dos  30  minutos  a  cada  4 horas  de  direção  seja observado. O empregador se sujeitará a multa a ser  aplicada pelo auditor fiscal do trabalho e ainda a condenação a indenização na Justiça do Trabalho.

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Luciane Anretta  Maldonado é  sócia  do  escritório  Maldonado  e  Gahyva  advogados,  pós-graduada  em Direito  do  Trabalho  e  Processo  do  Trabalho,  consultora  preventiva  em  matéria  trabalhista,  coordenadora  do  setor Trabalhista do escritório, professora de Direito Civil e do Trabalho e autora de diversos artigos.

Samantha  Rondon  Gahyva  Martins  é  sócia  do  escritório  Maldonado  e  Gahyva  advogados,  pós-graduada  em  Direito  e  Processo  do  Trabalho,  e  em  Direito  Tributário,  consultora  preventiva  em  matéria  trabalhista; professora de Direito Tributário e Civil e autora de diversos artigos.