Agosto é o mês do desgosto, dizia o povo antigo. Foi nesta data, em 2012, que o governo federal lançou o vultoso pacote de privatização de rodovias e ferrovias, como nunca antes neste país. Privatização é o que é, mas veio emoldurado por retórica dispensável, tipo “estamos fazendo parceria com o setor privado para beneficiar, para saldar uma dívida de décadas e um atraso nos investimentos e assegurar o menor custo logístico”. Tal foi dito por Dilma, apelando por desculpa esfarrapada ao negar que estaria repetindo atos do antecessor FHC. Estão certas as palavras da presidenta quanto ao atraso de décadas. Uma delas, a mais covarde, por conta do boicote de Lula aos clamores viários e de suas vítimas em Minas.
Por falar em atraso na oferta de rodovias bem dimensionadas, o tema encaixa-se como engrenamento de marcha não sincronizada, mediante dupla debreagem, no caso brasileiro. Até na coincidência de datas. Exatamente em 6 de agosto de 1932, surgia na Alemanha pré-nazista o revolucionário programa de construção de autoestradas, chamado na difícil língua teuta de Reichsautobahnen.
Na realidade, não contou no início com o apoio do partido nazista, ainda fora do poder. A iniciativa era muito precoce, mas de futuro garantido. O prefeito Konrad Adenauer, de Colônia ─ cidade às margens do rio Reno, estado da Renânia do Norte-Vestfália ─ alocou recursos junto ao governo central e iniciou a ligação da cidade com a vizinha Bonn, numa distância de uns 30 quilômetros. A autoestrada recebeu a sigla de A 555 e Adenauer passou à história como o ‘inventor’ do conceito. Mais tarde, terminada a 2ª. Guerra Mundial, ele se tornou o chanceler da Alemanha.
O prefeito virou projetista por especificar a via já fechada, com pista dupla, rampas por volta de 4%, cada qual com duas faixas. Só faltava a mureta divisória, ainda não pensada e improvisada por uma lista amarela. O feito de Adenauer ficou marcado por antecipar a oferta de boa rodabilidade muito antes que houvesse demanda de tráfego local. Deu motivo a críticas de gregos e troianos: “um luxo para poucos”, já que o automóvel era inacessível às massas e o carro Fusca ainda não havia sido criado por Ferdinand Porsche. Ocorreu, no entanto, que o desemprego estava altíssimo e a construção da A 555 contratou mais de 5 mil trabalhadores, os quais, literalmente fizeram o serviço de máquinas, até então muito precárias.
Percebendo o sucesso político da iniciativa, Hitler confiscou a iniciativa da construção da autoestrada para si, a ponto de seu ministro da propaganda, Joseph Goebbels, divulgar que o chefe havia concebido não só a A 555, como toda a malha de autobahns alemãs, “rabiscando o mapa aberto sobre os joelhos”, quando Hitler esteve preso após o fracasso do putsch (golpe de estado) de 1923.
Passada a guerra, Adenauer que “gostava de carros velozes”, retomou a Reichsautobahnen com ímpeto total e a malha se tornou a segunda maior do mundo, com cerca de 13 mil quilômetros de extensão, superada apenas pela americana. Sempre com, no mínimo, duas pista de duas faixas cada. A boa malha alemã começou em 1932, JK só começou a abrir ‘uns becos’ por aqui, em 1957. Mesmo com atraso de 25 anos, ‘rodófobos’ o acusam de optar pelo modal errado…