Dilene Antonucci

Revista Carga Pesada

Considerando o número de caminhões fabricados no Brasil nos últimos quatro anos, já com motores dentro das normas do Proconve P7 (equivalente ao programa europeu Euro 5), o consumo de Arla 32 no País está pelo menos 40% abaixo do esperado.

Esse é o número estimado pela entidade que reúne os fabricantes do Arla 32, a Associação dos Fabricantes de Equipamentos de Controle de Emissões de Poluentes da América do Sul (Afeevas).

Junto com o diesel S10, o Arla 32 é o reagente à base de ureia necessário  para reduzir as emissões de gases do escape, dentro do que prevê o Programa de Controle de Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve P7), do Ministério do Meio Ambiente.

As causas e consequências dessa situação foram assunto no 13º Fórum da Sociedade de Engenharia Automotiva – SAE BRASIL – de Tecnologia de Motores Diesel, realizado em Curitiba nos dias 23 e 24 de agosto. O painel específico sobre esse tema – “Experiência do Transporte Rodoviário com o Proconve P7” – teve como mediadora a editora da revista Carga Pesada, Dilene Antonucci, convidada para exercer essa função pela organização do evento.

Sobre a grande diferença entre o número de caminhões fabricados desde 2012 e o consumo de Arla 32, o diretor adjunto da Afeevas, Elcio Farah, disse em palestra que, “mesmo que parte da frota esteja parada em função da crise, são  muitos os caminhões que têm circulado sem o uso correto do Arla, e isso é fraude passível de punição”.

Farah pediu mais fiscalização para evitar a burla ao Arla 32: “Precisamos evitar a perda dos benefícios da fase P7 do Proconve para não regredirmos a uma situação de 20 anos atrás, quanto ao controle e à redução das emissões de óxidos de nitrogênio”.

Esses gases são perigosos e podem, por exemplo, produzir chuva ácida.

Giancarlo Pasa, dos postos Túlio: preço do Arla 32 vem caindo ano a ano

POSTOS – Empresários do varejo de combustíveis confirmam que há gente usando caminhões com motores Euro 5 sem Arla 32. O problema é maior na rota dos grãos. Nelson Soares Junior, diretor executivo do Sindipetróleo de Mato Grosso, acredita que naquele Estado menos da metade (dos caminhões Euro 5) estão usando o reagente. É o que outros donos de postos lhe contam. “Os próprios donos de transportadoras tomam essa decisão. Eles estão buscando economia em tudo”, afirma.

Soares lamenta o fato. “É muito ruim porque o Arla 32, além de reduzir a poluição do ar, traz mais eficiência ao veículo.” Já a venda do diesel S10 está dentro do esperado. “Sua eficiência está provada”, observa ele.

No Paraná, o diretor da Federação Nacional dos Postos de Combustíveis (Fecombustíveis) e da rede de postos Túlio, Giancarlo Pasa, tem a percepção de que nas rotas mais voltadas para o transporte de industrializados o problema seja menor. “Para mim, poucos deixam de usar Arla, talvez 5% a 10% dos caminhões”, estima. De acordo com o empresário, o preço do aditivo vem caindo ano a ano e os transportadores temem colocar em risco a vida útil de seus veículos sem o Arla 32 e o diesel S10. “Alguns até usam S10 em caminhão Euro 3 porque dizem que economizam até 3% no consumo”, declara.

Ele tem cinco postos na região de Curitiba e dois no Rio Grande do Sul.

FISCALIZAÇÃO – A Polícia Rodoviária Federal e o Ibama têm realizado operações de fiscalização do uso do Arla 32. Bastam algumas gotas da substância “Negro de Eriocromo T” para se saber, na hora, se a substância do tanque é Arla 32 mesmo.

Se for constatada adulteração do sistema, é aplicada multa de R$ 127, segundo o policial rodoviário federal Paulo Henrique Demarchi, que esteve no Fórum. “Já a fiscalização do Ibama pelo crime ambiental pode gerar multas de até R$ 1 milhão, como aconteceu com uma empresa de transportes do Centro-Oeste que aboliu o uso de Arla em toda a frota”, informou.

Em função das características do motor, a falta da Arla aumenta em quatro ou cinco vezes a emissão de poluentes na atmosfera e danifica principalmente o catalisador. O que transportadores e caminhoneiros costumam fazer para fugir da obrigação de usar Arla 32 é instalar um chip que “engana” o sistema eletrônico do caminhão ou usar Arla agrícola e até mesmo água.

Cristiano Doyama (Volvo); Elcio Farah (Afeevas); Dilene Antonucci (Revista Carga Pesada); Paulo Henrique Demarchi (PRF) e Wilson Rebello (Setcepar) durante painel no Fórum da SAE

 

Responsabilidade é de toda a cadeia, diz transportador

Levando a visão do transportador para o Painel “Experiência do Transporte Rodoviário com o Proconve P7”, o diretor do Instituto Setcepar de Educação do Transporte, Wilson Rebello, disse que o setor não é contra a tecnologia, mas que toda a cadeia tem que ser cobrada e não apenas quem faz o transporte.

“A fiscalização tem acontecido na ponta, na estrada, no teste da fumaça. Mas quem fiscaliza a qualidade do diesel e do Arla? Muitas vezes o transportador é apenas uma vítima. É preciso criar parâmetros claros de inspeção”, reclamou.

Rebello lembrou que os governos obrigam a adoção de tecnologias que aumentam os custos do transporte, mas muitas vezes o embarcador ou o dono da carga não aceita pagar a parte que lhe cabe na nova situação. “Temos um prejuízo duplo: no custo da nova tecnologia e na perda da capacidade de carga. Com os equipamentos para controle de emissões, os caminhões levam 150 quilos de carga a menos. Em um mês, no trajeto entre Curitiba e São Paulo, isso significa uma perda de R$ 6 mil de faturamento”, informou o empresário.

Ele defendeu que, nos próximos passos da atualização do Proconve, os transportadores venham a ser ouvidos.

OPINIÃO – Outras lideranças e personagens do transporte falaram à Carga Pesada sobre este tema. O presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas de São Paulo (Setcesp), Tayguara Helou, discorda dos números apresentados no evento. “Uma porcentagem mínima dos transportadores não tem utilizado corretamente o sistema e mesmo assim porque, em algumas regiões, o abastecimento de Arla e diesel S10 é precário”, disse ele.

Já o caminhoneiro baiano Fernando Pitanga, vencedor de uma das etapas da competição Melhor Motorista de Caminhão do Brasil, da Scania, e dono de um caminhão que usa Arla 32, tem outro tipo de crítica: “O Proconve P7 deveria ser cumprido à risca pelo próprio governo.  Ele também prevê estímulos para a renovação da frota e a retirada de circulação de caminhões com mais de 30 anos, mas isso não foi feito”

Pitanga lembrou que a atual situação é contraditória: um motorista com caminhão novo que não esteja usando Arla 32 pode ser punido, enquanto um caminhão antigo, muito mais poluente, está livre para rodar à vontade. “Por causa disso, os caminhões fabricados antes de 2012 estão mais valorizados atualmente. Para nós ficaram os maiores prejuízos. Se o governo não cumpriu com a parte dele, renovando a frota, como pode querer ser rigoroso na fiscalização em cima da gente?”

Veja a seguir as opiniões de dois leitores do site da Carga Pesada:

Welligton Marcio Torres

“Qualquer tecnologia nova sofre resistência, como vimos quando surgiu o sistema eletrônico na alimentação em substituição aos carburadores e bombas injetoras mecânicas, mas com o tempo ficamos surpresos com o resultado, rodando milhares de quilômetros sem ter que interferir em ajuste de bico, reforma de bomba injetora mecânica etc.

Em relação ao Arla 32 está se dando o mesmo. O Arla ajuda a reduzir a poluição e fico pensando que isso nos permitirá deixar um mundo melhor para nossos filhos e netos.”

João Cavalheiro

“Não consegui repassar o custo com o Arla 32, por isso achei melhor trocar o caminhão por um mais velho, como muitos estão fazendo. Posso estar errado: esse tal de Arla não muda em nada e não tem nada a ver com meio ambiente, foi só para aumentar despesa e ficar pior do que já estava.”