Cristina Oliveira Costa teimou para ser caminhoneira. Conformado, o pai achou melhor “ensinála a fazer direito”. E ela foi uma ótima aluna

Cristina Oliveira Costa teimou para ser caminhoneira. Conformado, o pai achou melhor “ensiná-la a fazer direito”. E ela foi uma ótima aluna

Edição 189 – dez 2016/jan 2017

Nelson Bortolin

Mineira de Contagem, Cristina Oliveira Costa, 34 anos, abraçou a profissão de caminhoneira por influência do pai, Gerson Costa Filho, hoje aposentado. Já tem 14 anos de estrada e está feliz – não se vê fazendo outra coisa. Cristina tem uma meta: chegar à final do concurso de melhor motorista da Scania. Este ano, entre as 381 mulheres inscritas no Scania Driver Competitions (SDC), ela foi a única que chegou à semifinal. “Cheguei perto e não vou desistir”,afirma. Ela já tinha participado três vezes da competição, quando se chamava Melhor Motorista de Caminhão do Brasil. “O pior adversário é o nervosismo. Na prova prática, a adrenalina sobe muito e atrapalha o desempenho”, acrescenta Cristina, que se atrapalhou na hora de entrar na garagem em marcha à ré e acabou fora da final.

Como motorista da Tora Transporte,Cristina leva uma vida tranquila: puxa fio-máquina (rolos de arame) de Santa Luzia a Contagem, um trajeto de 30 quilômetros. “Começo às 6 horas da manhã e vou até as 14”, conta. Em geral, faz uma viagem por dia, às vezes duas, “quando a fila não está muito grande”. Dorme todos os dias em casa. Cristina descobriu os caminhões aos 20 anos porque o pai havia se aposentado do emprego na indústria e resolveu se aventurar no transporte. “Desde que meu pai começou a trabalhar com caminhão, eu o acompanhei. Aprendi tudo da estrada com ele”, informa.

Caçula de quatro irmãos, os outros também seguiram o pai – mas no trabalho na indústria. Seu Gerson não gostou quando viu o gosto da fi lha por caminhão. “Mas eu insisti. Ele viu que não ia ter jeito e me disse: ‘então é melhor eu te ensinar a fazer direito’.” A caminhoneira tem um jeito interessante de comparar seu amor pelo volante com duas pessoas que… se amam. “No começo, a gente tem um certo medo do outro, mas acaba se encantando. Começa o namoro. Depois, o assunto fica mais sério e vira casamento. Só não vai ter divórcio para mim. Apesar de algumas dificuldades, eu gosto do que faço.”

Esta mineira também já foi de viajar longas distâncias. E, como outras mulheres, não hesita em dizer qual é o principal problema das estradas: “É a falta de banheiro para mulher. Muitos postos não têm infraestrutura nem para os homens, quanto mais para mulher”.

Sobre preconceito contra caminhoneiras, ela afirma que esse problema já foi maior. “Hoje, muitas empresas preferem contratar mulher. Alguns colegas é que têm preconceito, não cumprimentam a gente, fazem piadinha. Mas eu me sinto respeitada.”

 

Amíria adora uma competição

Amíria Strapasson com o marido e incentivador Hélio: “Quando você entra no caminhão,
não pensa em mais nada”

A paranaense Amíria Strapasson, da cidade de Colombo, não só vem participando dos concursos de melhor motorista da Scania, como não resiste a uma competição do tipo slalom, na qual o vencedor é o que consegue concluir um percurso de obstáculos em menor tempo. Ela foi uma dos 22 competidores que participaram da 1ª edição do Slalom Truck Race, de Arapongas (PR) dias 3 e 4 de dezembro  “Eu adoro a adrenalina dessas provas. Quando você entra no caminhão, não pensa em mais nada. Só quer saber de desviar dos cones e terminar o mais rápido possível”, comenta.

Quem levou Amíria para as pistas foi o marido Hélio Strapasson. “Um amigo havia ganhado um carro numa competição dessas. E o Hélio começou a participar”, afirma. Isso foi em 2000. O marido venceu uma prova em 2005 e levou para casa um carro zero-quilômetro. Como, pelo regulamento, o vencedor não pode voltar a competir nos anos seguintes, Hélio convenceu Amíria asubstituí-lo. E ela tomou gosto pela coisa. Já chegou muito próximo, mas ainda não conseguiu subir à posição mais alta do pódio. Mas, persistente, segue tentando.

Também foi Hélio que levou a mulher para a profissão de caminhoneira. Ele começou a dirigir profissionalmente em 1981. E ela, em 1987. “Nas primeiras viagens só acompanhava meu marido, mas acabei gostando e comecei a pilotar”, explica. De lá para cá, eles só viajam juntos. Os dois vêm de famílias de caminhoneiros. A única fi lha do casal, hoje com 26 anos, não seguiu o ofício dos pais e parentes, mas casou-se com um estradeiro. “Parece uma coisa que está no sangue”, diz.

Eles transportam frutas e verduras de Curitiba para São Paulo e Rio de Janeiro. E sofrem com a crise econômica. “Tem que gostar muito para continuar. O frete está muito baixo, não tem segurança. Mas eu adoro a vida na estrada”, confessa.

Amíria também tem outra ambição, que é chegar à final do concurso da Scania. Neste ano, foi até a terceira fase. Em 2014, ficou em 10º lugar. Ela afirma que hoje ninguém mais se espanta ao ver uma mulher dirigindo caminhão na estrada ou competindo numa pista. Mas já sentiu olhares preconceituosos no passado. E também ouviu piadas. “Mas entrava por um ouvido e saía pelo outro.”