Nelson Bortolin
Revista Carga Pesada
Reduzir custos é uma das principais preocupações do transportador brasileiro, tendo em vista o atual achatamento do valor dos fretes. Em tempo de crise econômica, essa preocupação é redobrada. Mas boas soluções podem ser encontradas e a situação econômica do País tem feito muita gente olhar de um jeito diferente para um setor em franca expansão: o remanufaturamento de peças de caminhões.
Para quem não sabe, remanufaturar uma peça é bem diferente de recondicioná-la, e mais ainda de repará-la. Os conceitos foram muito bem definidos na norma 16.290, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) (veja quadro abaixo). Um produto só pode ser remanufaturado pelo seu fabricante original. Ele custa, em média, 70% do preço do novo, à base de troca. E tem a mesma garantia da peça nova.
Enquanto a venda de peças novas caiu 12% nos primeiros meses deste ano, segundo o sindicato dos fabricantes, o Sindipeças, a de remanufaturados está em crescimento, de acordo com o presidente da Associação Nacional dos Remanufaturadores (Anrap), Jefferson Germano, que também é gerente de aftermarket (mercado de reposição) da Knorr-Bremse para o Brasil e a América Latina. “Nosso mercado está crescendo 10% ao ano”, afirma.
Apesar de mais baratos e de serem garantidos, os produtos remanufaturados representam, segundo a Anrap, apenas 6% da venda de peças de reposição no País. Nos Estados Unidos esse índice é de 16% e na Europa, de 9%. A precariedade da logística reversa, ou seja, do processo de levar a peça velha até a fábrica, é uma das dificuldades existentes para a ampliação desse mercado.
Na opinião de Germano, também existem preconceitos a vencer e esclarecimentos a fazer aos clientes, para que as peças remanufaturadas se popularizem. “Às vezes, numa oficina, o mecânico nem sabe o que é um remanufaturado. Nem para os transportadores está clara a diferença entre remanufaturado, recondicionado e reparado. Esses conceitos se confundem na hora de decidir pela compra.”
O grande desafio da Anrap, de acordo com ele, é mostrar essa diferença. “Nós temos trabalhado, fazendo seminários e apresentações. Nosso desafio é disseminar o conceito do remanufaturado”, conta. Na fábrica de Itupeva (SP), a Knorr-Bremse produz freios a disco, compressores, sistemas de válvulas e servos remanufaturados. “A linha de montagem é a mesma dos novos”, conta Jefferson Germano, e o produto remanufaturado vai sair com a mesma tecnologia do novo. “Se eu pego um freio de 10 anos e ele sofreu atualização tecnológica, o remanufaturado tem de ser devolvido com a atualização”, declara. Dependendo do produto, de acordo com Germano, é possível fazer quatro remanufaturas.
Na Cummins Brasil, onde os remanufaturados chegam a representar 25% do volume de peças de reposição, a procura aumentou nos últimos meses, segundo o diretor de vendas, Mauricio Rossi. De acordo com ele, com a queda no volume e no valor dos fretes, há dois tipos de frotistas. “Um deles vendeu caminhões e ajustou sua frota ao atual cenário”, aponta. Esse, para fazer manutenção, coloca tudo na ponta do lápis, e tem ajudado a aumentar a venda de remanufaturados. Já o segundo tipo está com caminhões parados no pátio e, quando precisa, em vez de comprar uma peça nova ou remanufaturada, tira a peça do caminhão que não está usando e a coloca em outro.
Rossi explica que, ao optar pela peça remanufaturada, o cliente não está de olho apenas no preço, mas também no tempo que o caminhão vai ficar parado para manutenção. “A demora para a reparação de um motor pode ser grande. Então, o interessado muitas vezes opta em trocar o motor com defeito por um remanufaturado.”
Outro aspecto citado pelo diretor está relacionado ao valor de revenda do caminhão. “Existem frotistas que optam sempre por peças originais para que o veículo não perca muito valor”, ressalta. A peça nova é a primeira opção, mas, como atualmente é preciso economizar, alguns estão optando pela remanufaturada, pela sua qualidade e porque também é considerada original.
Luiz Fernando Teixeira Silva, diretor de Vendas e Marketing da ZF Services, confirma que, devido à crise, há um aumento de procura por essas peças. “O pessoal agora, quando vai fazer manutenção, busca custo por quilômetro e preço. E o remanufaturado oferece vantagem, sem contar que é feito dentro da mesma operação e do mesmo processo de produção de uma peça nova”, declara.
Ele diz que, embora em geral a peça remanufaturada custe 30% menos que a nova, essa diferença pode chegar, em alguns casos, a 40%. Questionado se o preço varia de acordo com o estado da peça usada entregue na rede distribuidora da ZF, ele diz que não. “Fazemos uma avaliação para determinar se a peça tem condições de ser remanufaturada ou não. Mas o preço é fixo”, alega.
Os remanufaturados representam 20% da produção da ZF, segundo Silva. Essa participação poderia ser maior, não fossem o custo e a complexidade da logística reversa. “Uma coisa é fazer logística reversa em São Paulo. Perto dos grandes centros, é bem viável. Mas, se você tem de transportar duas embreagens do Nordeste até o centro de remanufatura, fica bem mais difícil.” Outra dificuldade, segundo ele, é a formação de uma rede que deve ser especialista no produto e que possua equipe com carro técnico para coleta.
DIFERENÇAS ENTRE REMANUFATURADOS, RECONDICIONADOS E REPARADOS – ABNT 16.290, de 2014
BEM REMANUFATURADO
É o resultante de processo industrial realizado pelo fabricante original do produto novo, por empresa pertencente ao mesmo grupo ou por empresa autorizada pelo fabricante original especificamente para este processo.
Envolve:
Desmontagem de produtos usados para determinar o estado de conservação e substituição de componentes desgastados por novos ou remanufaturados.
Deve ter funcionamento e desempenho iguais ou superiores aos dos novos, inclusive em se tratando de garantia.
BEM RECONDICIONADO
Resultante do processo industrial realizado por qualquer empresa.
Envolve:
Desmontagem do produto usado para determinar seu estado de conservação e substituição dos componentes desgastados por novos ou remanufaturados.
Deve ter funcionamento e desempenho equivalentes* às especificações do bem novo original, inclusive em termos de garantia.
Deve ter a marca original substituída pela do recondicionador.
BEM REPARADO
Resultante de processo técnico destinado ao restabelecimento de sua funcionalidade.
Envolve:
Reparação de seus componentes defeituosos ou desgastados.
Deve ter funcionamento e desempenho equivalentes* às especificações do bem novo original.
Deve ter a marca original substituída pela do reparador.
*O conceito de equivalente deve ser definido em norma específica, que ainda não foi publicada.