Revista Carga Pesada
O prazo de 45 dias dado pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social para que as empresas de transporte se adequassem à exigência do exame toxicológico para admissão e desligamento de motoristas terminou no dia 16 de abril. Segundo o ministério, os fiscais já começaram a multar quem descumprir a norma.
A legislação exige o exame, feito a partir de um fio de cabelo, em duas situações: nas contratações e demissões de motoristas profissionais pelas empresas e, no ato de habilitações de motoristas nas carteiras C, D e E, bem como na mudança entre essas categorias. Mas a Associação Nacional dos Detrans (AND) pediu ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) o fim da obrigatoriedade do exame nesses casos.
A entidade ameaça pedir a inconstitucionalidade da medida no Supremo Tribunal Federal. Os Detrans entendem que a exigência gera ônus excessivo aos condutores e não tem eficácia comprovada na redução de acidentes. Alguns estados, como São Paulo, conseguiram liminares na Justiça suspendendo a exigência do exame para habilitações de motoristas.
Crítica
Rodolfo Rizzotto, coordenador do SOS Estradas – Programa de Segurança nas Estradas -, é um dos principais defensores do exame no País. Ele critica a posição dos Detrans e lembra que, a lei 13.103, exige o teste desde 2 de março deste ano para motoristas que dirigem vans, ônibus e caminhões.
Em virtude das liminares concedidas a estados como São Paulo, o SOS Estradas fez uma estimativa de quantos motoristas profissionais podem ter recebido a CNH para dirigir coletivos e veículos pesados, apesar de serem “potencialmente usuários regulares de drogas”. Para isso, foi estabelecido como percentual de possíveis usuários de drogas o índice de 10%, “estimativa mínima encontrada entre os motoristas profissionais na média dos estudos já realizados nos meios acadêmicos e em ações do Ministério Público do Trabalho e da Polícia Rodoviária Federal”.
Segundo a estimativa do SOS Estradas, pelo menos 8.593 motoristas receberam a CNH, apesar de serem “usuários regulares de drogas”, nos primeiros 30 dias em que a lei está em vigor, utilizando como base as carteiras emitidas em 2013. Destas, 72% fornecidas pelo Detran de São Paulo, Estado que representa 34% das CNHs emitidas nacionalmente para as categorias C, D e E.
São Paulo é o único Estado das regiões Sul e Sudeste que não está exigindo o exame. Foram pelo menos 6.183 motoristas “potencialmente drogados” em São Paulo contra 677 na Bahia, o segundo Estado em volume de carteiras emitidas sem a realização do exame. Na avaliação do SOS Estradas, a situação é ainda mais grave, já que em 2015, segundo dados do Detran de São Paulo, foram emitidas 951.036 carteiras de habilitação nas categorias C, D e E, com média mensal de 79.253. Isso indica que São Paulo pode ter liberado pelo menos 7, 9 mil habilitações para motoristas drogados, considerando os 10% de positividade.
Atualmente, segundo o programa, apenas nove Detrans do país não estão exigindo o exame e 18 já obrigam os motoristas a atender a exigência da Lei. “Apesar de alguns Detrans questionarem a efetividade do exame, o mesmo já é utilizado no Brasil há pelos menos 10 anos. Companhias aéreas, polícias militares, polícia rodoviária federal e mais recentemente até o Ministério Público Federal também exigem o exame para ingresso em suas instituições”, afirma Rizotto.
Por outro lado, na estimativa do SOS Estradas, pelos menos 9.792 motoristas “usuários regulares de drogas” foram impedidos de obter a CNH, e deverão aguardar mais 90 dias para se submeterem a um novo teste. “Mantida essa tendência nesses Estados, pelos menos 117 mil motoristas usuários de drogas serão impedidos de tirar a CNH e compelidos a se submeter a tratamento médico que os impeça de expor a risco suas vidas, bem como, as vidas de terceiros que nada tem a ver com seu vício, nos primeiros doze meses da aplicação da lei, levando-se em conta somente os 18 Estados que já exigem o mesmo”, diz o programa.
Tratamento
Na avaliação do SOS Estradas, além dos acidentes evitados e das vidas poupadas nas rodovias e nas ruas onde se exerce o transporte urbano coletivo, levando-se em conta que os veículos pesados representam menos de 4% da frota, mas estão envolvidos em 40% dos acidentes com vítimas fatais, a retirada de motoristas usuários de drogas da pista, “irá permitir que busquem o devido tratamento, além de combater e mesmo impedir a concorrência desleal, pois quem se vale de substâncias psicoativas para cumprir suas jornadas tira o frete de quem não usa, ao aceitar condições irresponsáveis que somente sob efeito estimulantes químicos de efeitos devastadores é possível suportar”.
Rizzotto, Coordenador do SOS Estradas, alerta ainda que os Estados que obtiveram a liminar que libera o motorista da exigência do exame poderão ter uma corrida dos motoristas usuários de drogas para renovar logo a CNH, antes da exigência de o exame voltar a vigorar, com o julgamento do mérito da matéria. “Em São Paulo, não existe possibilidade de alegar falta de laboratórios e pontos de coleta. Lá, assim como em todos os Estados brasileiros, a rede de coleta que atua em atendimento aos seis laboratórios credenciados pelo órgão máximo de trânsito federal (Denatran), soma mais de 5 mil laboratórios, rede suficiente para atender à demanda. Portanto, a liminar, que tem caráter precário, tende a cair. Nesse caso, os motoristas que receberem a CNH nesse período e forem usuários de drogas estarão com uma licença para matar fornecida pelo Detran de São Paulo”, aponta Rizzotto.
Segundo ele, nos Estados Unidos, onde grandes transportadoras vêm utilizando o exame há 10 anos, o índice de caminhoneiros usuários de drogas caiu para praticamente zero nestas empresas, assim como os acidentes com profissionais sob efeito de substâncias psicoativas. Exames toxicológicos para motoristas profissionais são utilizados naquele país desde 1988.