Pela segunda vez em pouco mais de uma década (a primeira foi em 1999), caminhoneiros autônomos decidiram fazer uma demonstração prática desta afirmação simples: sem caminhão, o Brasil para. Bastaram 24 horas de tanqueiros de braços cruzados em São Paulo para começar a faltar combustível nos postos da Capital. Depois de 48 horas já havia um deus-nos-acuda, e então surgiu a mão forte do Poder Judiciário para obrigar à volta do abastecimento. Que voltou.

Desta vez, como em 1999, o gesto dos caminhoneiros teve um significado altamente político. É isso mesmo, é preciso usar essa palavra, que fere os olhos e ouvidos de muita gente bem situada: foi um gesto político. Não no sentido da política partidária (e se fosse, não haveria mal nenhum), mas num sentido ainda mais nobre: o da cobrança, por uma categoria de trabalhadores, de um direito de cidadania, que é o direito a um trabalho digno e justo e de meios adequados para o seu exercício.

As restrições ao tráfego na Marginal do Rio Tietê e em algumas avenidas daquela região criam tal dificuldade ao trabalho dos tanqueiros e caminhoneiros de outros segmentos que inviabiliza a atividade. Mesmo assim, e apesar do alerta de representantes da categoria, assim como do empresariado, a medida foi posta em prática. Restou o recurso de… sumir! Só sumindo, isto é, deixando de circular, de trabalhar, é que os caminhoneiros puderam ser vistos e, de alguma maneira, ouvidos.

Nós, da Revista Carga Pesada, gostamos de dizer que estamos a serviço da categoria dos caminhoneiros em geral, dos autônomos em particular. O que não quer dizer que avalizamos tudo o que se decide nas entidades de classe dessas categorias. Sempre procuramos analisar as ideias que estão por trás dos atos, sabendo que nem tudo o que é declarado como ideia é sincero, e que, em política, sempre estão em jogo muito mais interesses do que os declarados publicamente.

No caso da greve de São Paulo, porém, independente do que cada parte ou pessoa pensava que tinha a ganhar com a paralisação, achamos que vale a pena dizer isto: foi um jeito firme de mostrar à classe política e aos dirigentes em geral do país que, às vezes, é preciso dar atenção àqueles que costumam não dizer nada, porque estão muito ocupados com a própria sobrevivência.  O Brasil está cheio de problemas. Em alguns âmbitos, como o do trânsito, das rodovias, do transporte de cargas, esses problemas são tão concretos que estão matando pessoas em grande número diariamente. E ninguém vai fazer nada?

Os autônomos de São Paulo acharam um jeito de mostrar que estão vivos, que estão no limite do sacrifício e que não é lavando as mãos e criando mais sacrifício para eles que a classe política vai ficar usufruindo das benesses do poder sem precisar dar contas a ninguém.