A dificuldade de encontrar mão de obra capacitada e a aprovação da Lei do Descanso (12.619) levaram a Del Pozo Transportes, de Ponta Grossa (PR), a tomar uma decisão inovadora. Desde maio do ano passado, a empresa está financiando aos empregados, em 60 parcelas, parte de sua frota. Eles deixam de ser funcionários, abrem empresas e têm os veículos transferidos para o nome dessas firmas, passando a prestar serviços para a Del Pozo.
“Os veículos passam a ser deles e, a partir daí, todos os bônus e também os ônus passam a ser deles como em uma compra normal de mercado. Não é um contrato de gaveta”, afirma o diretor Angel Miguel Lillo Del Pozo San Juan, o Tito. Até agora, 92 veículos já foram vendidos. Eles têm cerca de quatro anos de fabricação e são extrapesados Volvo e Mercedes-Benz, que custam em média R$ 200 mil. Os veículos são entregues com revisão completa e pneus novos. “Fazemos um trabalho como a Volvo faz com os seus seminovos (Programa Viking). Não entregamos veículos com problema. Seria um tiro no pé”, justifica
Segundo o diretor, o negócio tem sido bom para ambos os lados, tanto é que dois caminhoneiros já estão adquirindo o segundo caminhão. A venda é feita com prazo de 60 meses para pagamento e juros “abaixo do mercado”, segundo Tito.
Só podem obter o financiamento os caminhoneiros que atingirem uma determinada nota concedida pela empresa, que leva em conta a quilometragem percorrida por ele desde que foi contratado, e a performance do profissional em relação a gastos com combustível e pneus. “Tem de rodar sim, mas tem de pensar primeiramente em segurança e qualidade”, diz o diretor. Segundo ele, o lado ruim é que deixam de ser funcionários justamente os melhores motoristas. “Mas se não fizermos algo, os bons profissionais de qualquer forma irão comprar seus veículos ou irão para pequenas empresas onde são oferecidas condições operacionais mais flexíveis e diferenciadas”, acredita.
O diretor considera que a aprovação da Lei do Descanso foi “o tiro de misericórdia para as maiores empresas que são as mais vigiadas pela fiscalização”. De acordo com Tito, com a lei, os caminhões perderam 30% de produtividade. E a participação da mão de obra subiu de 20% para 25% na planilha da empresa. “Estamos aplicando a lei na totalidade, mas é muito difícil. Para quem trabalha só com rotas pré-definidas é mais fácil. Mas para a frota que opera por vários estados, fica complicado administrar a logística e os horários dos motoristas”, declara.
A transportadora, que carrega produtos industrializados e alimentícios, tem hoje em torno de 300 motoristas para operar a frota própria, e mais de 200 agregados, entre eles os que se tornaram empresários.
A intenção da Del Pozo é continuar com o processo de financiamento de veículos. “Acho que é um ótimo plano de carreira que a Del Pozo está oferecendo aos motoristas que já estão na empresa e os que virão a fazer parte dela atraídos pela oportunidade de, em futuro próximo, vir a ser mais um empresário fazendo parte do pool”, afirma. De acordo com ele, o importante é crescer. “Não importa de quem seja a frota, temos a noção que todos envolvidos devem ganhar. O objetivo final é continuar atendendo da melhor forma possível a demanda crescente de nossos clientes e do País”, declara.
Ex-funcionário diz que sua vida mudou para melhor
Para o ex-funcionário da Del Pozo e agora empresário Marcelo Teixeira Honório, 43 anos, a vida melhorou muito. Morador de Nova Friburgo (RJ), ele já está financiando o segundo caminhão. O primeiro, um Mercedes 2540 (ano 2008), está pagando desde maio do ano passado. E o segundo, o Volvo FH 380 (2006), desde o mês passado.
“Estou faturando bruto cerca de R$ 35 mil por mês (no primeiro veículo), o que representa mais ou menos R$ 8 mil líquidos, depois de descontadas as despesas do caminhão, a manutenção e a prestação”, afirma. A prestação do Mercedes é de R$ 5.300 e a da Volvo, de R$ 5.200.
Honório está contratando um motorista par dirigir o segundo caminhão. Ele puxa cimento de Cantagalo para a capital fluminense, numa distância de 250 km. “Volto para casa todo dia”, afirma. O motorista diz que está cumprindo a Lei do Descanso parcialmente. O intervalo de meia hora a cada quatro horas ao volante, ele diz que respeita rigorosamente. Mas o descanso de 11 horas entre dois dias de trabalho, Honório não consegue cumprir. “Começo a trabalhar às 5h30 da manhã e vou até às 22 horas”, conta. O descanso, portanto, é de apenas 7h30.
Questionado sobre o processo de abertura da empresa, ele afirma que foi “simples”. “Contratei um contador e ele fez tudo para mim. Minha mulher agora me ajuda na parte burocrática, para não empatar meu tempo”, declara.
Sobre o futuro, ele diz que a expectativa é aumentar a frota. “Quero ir pagando as prestações e, conforme for entrando dinheiro, ir comprando mais caminhões”, ressalta.