Volta do 6×2 para tracionar bitrem e quarto eixo isolado em carreta prejudicam pavimento e trazem insegurança no trânsito
Nelson Bortolin
Olhando assim superficialmente, a resolução 882 e a deliberação 250, publicadas pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran) nos últimos dias de 2021, podem parecer benéficas aos transportadores, que precisarão investir menos para tracionar mais cargas. No entanto, para o engenheiro presidente da Associação Brasileira de Logística Pesada (Logipesa), João Batista Dominici, toda a sociedade vai pagar um preço pelas novidades. A legislação, que já está em vigor, vai causar danos ao pavimento e trazer insegurança no trânsito.
Basicamente, as regras permitem que o bitrem 7 eixos, com peso bruto total combinado (PBTC) de 57 toneladas, seja tracionado por cavalo 6×2 e não mais 6×4, como era exigido há cerca de 10 anos.
E ainda vai permitir cavalos três eixos 6×2 tracionando carretas com quatro eixos, sendo um isolado, com PBTC de 58,5 toneladas.
“Ao longo dos últimos 20 anos tem havido uma pressão permanente para aumento da produtividade do transporte rodoviário de cargas. As resoluções 210/06 e 211/06 que introduziram as configurações de até nove eixos são a prova viva dessa queda de braço em favor da redução de custos do frete, sem, contudo, levar em conta os impactos sobre a infraestrutura e sobre a segurança do trânsito”, afirma
Ele ressalta que a liberação de um quarto eixo nas combinações de veículos articulados com comprimento acima de 17,50 metros vai permitir que esses veículos carreguem 1,5 tonelada a mais que o “bintrenzinho”. “Sem contar que, com a redução da tara do conjunto tanto no caminhão-trator, quanto no implemento, esse ganho pode chegar a pelo menos 3 toneladas, em alguns tipos de configurações”, afirma. Levar mais carga num mesmo veículo interessa mais ao embarcador que ao transportador, na visão dele.
Dominici considera que o fim da obrigatoriedade do trator 6X4 para combinações com até 58,5 toneladas faz o transportador achar que está tendo vantagem porque vai pagar menos no caminhão. Mas, na verdade, ninguém ganha com isso. “Reduz-se a segurança operacional e do trânsito, aumenta-se o desgaste dos pavimentos. Perdemos todos.”
Com as novas regras, haverá “cisalhamento (fraturas) e ondulação no pavimento asfáltico”. “Além disso, a volta do 6×2 significa a interrupção no desenvolvimento tecnológico dos caminhões”, alega.
O engenheiro ainda chama atenção para o processo de Autorização Especial de Trânsito (AET). Esperava-se que as novas normas acabassem com a obrigatoriedade de Projeto Técnico e Laudo de Vistoria. “Mas a pressão do Crea (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia), que lucra milhões com a emissão de ART’s, falou mais alto e essa exigência permaneceu intacta”, critica.
A única vantagem para os transportadores em relação às AETs é o fim da exigência da indicação das placas das unidades tracionadas, que podem ser substituídas a qualquer tempo, observado o mesmo tipo de configuração, assim como características de tara e de dimensões dos implementos.
As composições com carretas de quatro eixos com PBTC de 58,5 toneladas vão exigir AET para trafegar. “Mas isso será obrigatório somente quando o Denatran atualizar a portaria 63, de 2009”, avisa.