Clientes só querem caminhões maiores por causa do custo menor por tonelada

Nelson Bortolin

Transportadoras com sede em postos de combustíveis confirmam: os clientes não querem carregar em carretas pequenas. Conforme constatou a reportagem da Revista Carga Pesada, o problema se concentra no transporte de grãos e nas viagens longas.

Nesta terça-feira (21), percorremos postos às margens de rodovias em Cambé (PR) para conversar com transportadores. Pelo menos seis deles relataram que as carretas de três eixos (LS) estão praticamente paradas desde que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) iniciou a fiscalização eletrônica dos pisos mínimos de frete.

Nenhum dos representantes das transportadoras quis se identificar, alegando receio de se indispor com os contratantes. “A tabela existe desde 2018, mas não era cumprida porque a agência não fiscalizava. Agora, com essa mudança, os embarcadores estão receosos de que podem ser multados e estão tomando precauções”, disse um deles.

Entre essas precauções está a preferência por caminhões de maior capacidade de carga. Conforme mostrou a Revista Carga Pesada, o valor por tonelada pode ser até 20% mais baixo quando a carga é transportada em combinações de nove eixos.

“Os clientes estão pedindo para carregar de carreta de quatro eixos para cima”, explicou um transportador. Segundo ele, a diferença no custo é significativa: “Num frete de grãos, dá de R$ 10 a R$ 15 por tonelada. É bastante coisa no final de um lote.”

Ele confirma que as LS estão praticamente paradas. “Nesse momento, sim. Mas vai chegar uma hora que não vai ter jeito. Acredito que, na safra da soja, os clientes vão ter que abrir exceção, porque a demanda é muito alta”, avaliou outro entrevistado.

Antes da nova forma de fiscalização, as diferenças de preço por tonelada entre LS e rodotrens eram pequenas. “Você conseguia um preço por tonelada que era mais ou menos igual. Agora, como a tabela está sendo seguida à risca, a diferença é grande”, afirmou um empresário.
Outro transportador contou que está difícil atender a todos os clientes, porque há escassez de carretas maiores. “Tem uns parceiros que já têm esses tipos de veículos, mas devido à demanda alta, dificulta um pouco.”

Há quem aposte numa mudança da metodologia de cálculo da tabela pela ANTT. “A questão da LS se complicou muito. Eu acho que a ANTT vai acabar mudando. Não tem como manter essa diferença que hoje, por exemplo, você paga R$ 125 daqui a Paranaguá numa carreta nove eixos e R$ 147 numa LS”, avalia.

Ele lembra que, antes da fiscalização eletrônica, o cálculo era mais flexível. “Antes funcionava assim: o cliente me perguntava quanto eu cobrava. Eu fazia o cálculo por tonelada, tirava a minha margem e repassava para o motorista. Aí, se ele tinha uma LS ou um rodotrem, ia receber o mesmo valor por tonelada.”

O empresário acrescenta outro problema: “Existem lugares, como o Norte Velho do Paraná, onde os nove eixos não podem transitar.”

Com a chegada da safra, o quadro tende a mudar. “Os fretes vão ficar acima do mínimo e, de novo, não fará muita diferença para o contratante se vai usar LS ou nove eixos.”

Questionado sobre a efetividade da fiscalização, o transportador confirma que as multas já estão sendo aplicadas. “Tem transportadora que já está sendo autuada. A multa já vem direto, não tem fiscalização física”, relata.

Com 75 anos de idade, o caminhoneiro autônomo de Cambé José Alves do Nascimento está há dez dias esperando uma carga de grãos para sua LS. “Hoje o pessoal só está querendo carreta que leva 40, 50 toneladas. Até para o bitrem (sete eixos) está difícil”, conta.

Bem desanimado e com problemas de saúde, ele diz que está aposentado. “Mas não tem como viver da aposentadoria de um salário mínimo. Vou tentando trabalhar até quando der.”

Impacto maior nos grãos

O impacto da fiscalização eletrônica dos pisos mínimos de frete pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) está concentrado nas carretas LS que transportam  grãos.

Higor Balbino de Souza, de Porecatu

Quem trabalha com cargas leves afirma que ainda não foi afetado. “Realmente esse problema ainda não nos alcançou. Aliás, houve até uma melhora no valor do frete”, diz Ademir Balbino de Souza, dono de uma LS puxada por um Iveco Stralis 2011. Morador de Porecatu (PR), o filho dele, Higor Balbino de Souza, que tem uma Volvo FH 380, ano 2004, também com carreta LS, confirma o cenário. “A gente ainda não sentiu na pele, graças a Deus, mas os colegas do Mato Grosso, que carregam grãos, estão voltando vazios.”

Especialista vê piso até 30% acima da realidade – Revista Carga Pesada