Painéis reuniram profissionais de toda a cadeia logística, desde o RH ao operacional, debatendo inclusão do ponto de vista de quem viveu esta realidade

Leiliani de Castro

O Rota Feminina é um movimento que fala sobre mulheres no setor do transporte e logística e, nesse guarda-chuva da diversidade, vem somando ao tema, desta vez evidenciando profissionais deficientes auditivos e visuais, bem como suas atuações. 

Nesta segunda-feira (19), o Rota Feminina realizou em Campinas (SP) seu quarto encontro, o “Conexões que movem”, em parceria com o Caminhoneiros Surdos do Brasil (CSB). O evento expandiu os horizontes da conversa sobre diversidade no setor de transporte e logística. Entre os painelistas, o movimento convidou caminhoneiras, gestoras e dois caminhoneiros surdos para palestrar, Daniel Momm e Jeferson Oliveira. 

Os recursos de acessibilidade utilizados foram a tradução das libras para a plateia, realizada por Raquel Moreno, idealizadora do Caminhoneiros Surdos do Brasil e, para fins de contemplar Cris Perogil, desenvolvedor cego, todos os painelistas foram instruídos a realizar a autodescrição, afim de facilitar a identificação. Para tal, costuma-se falar sobre a altura, cor e tamanho dos cabelos, acessórios, cor das roupas, entre outros. 

Políticas públicas e movimentos sobre diversidade

Rafaela Cozar, vice-presidente do Sindicamp, head de gestão e inovação na Roda Brasil Logística e integrante do Rota, conta à Revista sobre a interlocução do evento com o poder público, trazendo seus representantes aos painéis: “quando nós precisamos realizar algo, é necessário que a gente entre em contato com os órgãos governamentais para passar as nossas propostas. Cada vez mais eles vêm nos ouvindo. Então quando a gente fala de ESG, inclusão e diversidade, o poder público tem se mostrado cada vez mais propício a ouvir e cabe a nós levar essa mensagem para eles.” 

Cozar integra o movimento idealizado por Fernanda Sarreta e Suzana Soncin desde a sua gênese. Ela já atuou no palco, nos bastidores e nas redes. Por isso, revela: “a gente tem se preocupado, em todos os nossos eventos, em trazer o poder público de alguma forma. No evento de hoje trouxemos a ANTT, o Detran de São Paulo, a Polícia Militar Rodoviária, para que eles entendam, escutem, experienciem tudo isso e também tragam as visões deles, o dia a dia, as dificuldades, para que juntos nós cheguemos a um denominador comum”. 

Muito além do debate sobre desafios: reconhecer qualidades 

Assim, o “Conexões que movem” atuou em três frentes, sendo elas: o diálogo com o poder público; modos de incluir e casos de sucesso. Cris Perogil, um dos palestrantes, trouxe à conversa a questão da “interseccionalidade”. Ele é desenvolvedor de front-end do Itaú e explica à Revista a sua ocupação, bem como o conceito que levou ao painel: “O que é trabalhar construindo interface? Imagine que você está lá no seu banco e aperta o botão pix. No nosso dia a dia, temos instruções que a gente dá para o aplicativo, de como ele deve se comportar visualmente.” 

Sobre a questão da  interseccionalidade, “eu sou uma pessoa com deficiência, que tem uma vida além disso e o meu trabalho não precisa necessariamente ser pautado pela minha deficiência. Eu não aceito falar de diversidade se o tema não for pautado por uma evolução de processos relativos a isso, com jornadas técnicas e tudo mais. (…) Antigamente seria ‘como uma pessoa cega liga um computador?’. E tudo bem, não tem problema a pessoa ter uma dúvida sobre isso. Mas veja que não estou falando do meu trabalho, estou falando de uma ferramenta que me possibilita trabalhar. É isso que a interseccionalidade é pra mim, eu poder, enquanto uma pessoa com deficiência, abraçar outros recortes e falar sobre eles na minha cadeira. 

Maria Augusta Torres, líder do grupo de afinidade de neurodiversidade na IBM, já trabalhou com Cris e, na ocasião da entrevista, foi ouvida junto a ele. Augusta complementa: “o Cris palestra sobre tecnologia. Ele é extremamente capaz de ensinar outro desenvolvedor. Vi isso acontecer várias vezes. Quando me apresentaram o Cris, ele trabalhava em outra área, que não estava satisfeito”. Uma colega de RH, então, o apresentou, ao que Maria Augusta o convidou para o seu time. “A atividade que ele exerce é primordialmente ligada aos insights visuais. Então assim, ele poderia atuar na tecnologia cuidando de infraestrutura, da parte de back, mas ele tava mostrando ali o novo site do cartão black Itaú, eu babei! Vou querer pedir um! 

Rafaela Cozar, ao final da edição, estava feliz com os resultados do dia: “foi muito simbólica para todos nós porque falamos de temas delicados, sensíveis, mas que precisam ser falados. Ter feito essa parceria com o Caminhoneiros Surdos do Brasil  deixou a todos nós emocionados. (…) aprendemos muito com a Raquel, com o CSB, e a gente pode sentir muita coisa, de que de fato a gente precisa experienciar, se colocar no lugar do outro”. 

A quem se interessar pelo movimento, o Instagram @rotafeminina.move atualiza sobre novas edições de eventos. O próximo encontro será em novembro, na Fenatran, onde o movimento realizará seu segundo fórum de mulheres.