LUCIANO ALVES PEREIRA
Na primeira quinzena de novembro, o governo Dilma liberou a estatística dos desligamentos de funcionários públicos federais por desvio de conduta e outras mazelas. Em dez meses, mais de 460 servidores foram exonerados. Isto após o devido processo legal, contemplado pelo não menos obrigatório amplo direito de defesa.
Da considerável multidão, a informação oficial não especifica de quais ministérios ou repartições saíram os desligados, mas a degola atingiu a Polícia Rodoviária Federal (PRF). Seus agentes é que têm a ver com o mundo caminhonístico e, ao pinçar o fato, constata-se que não há só desencanto geral quanto à desenvoltura da corregedoria da instituição.Assim, por atuação desta, foi oficializada a exoneração do PRF Marco Aurélio Duarte Silva, denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF), por ter cobrado propina de um caminhoneiro de Contagem (MG), no posto da corporação da Rio-Bahia (BR-116) de Teófilo Otoni (MG).
O fato ocorreu em maio de 2006. Não cabe dúvida que já lá se vai um tempão. Exatamente pelo cumprimento dos prazos e recursos previstos em lei. Naquela data, Marco Aurélio abordou o estradeiro para fiscalizar os documentos próprios e do caminhão. Alegando irregularidades, o veículo foi retido, não sem ‘abrir o beco sombrio’ da liberação mediante pagamento de R$ 1 mil. Conforme consta no processo, o condutor, coagido deu-lhe R$ 200 em dinheiro e um cheque no valor de R$ 600, em cujo verso, o policial anotou a placa do veículo. Ao prestar conta da viagem, o patrão também não se conformou e ambos foram procurar a corregedoria da PRF, para se queixarem oficialmente.
DESLIGAMENTO
O processo disciplinar instaurado pela instituição acabou resultando na demissão do agente. O MPF continuou nas investigações, enquanto Marco Aurélio se recusava a submeter-se ao reconhecimento pessoal [ninguém é obrigado a produzir provas contra si]. Também se negou a fornecer material para identificação grafotécnica. A exigência pericial se fazia necessária para comprovar se a letra, com a qual foi anotada a placa do veículo no verso do cheque era de Marco Aurélio.
O cheque foi rastreado e descobriu-se que fora trocado no vizinho Posto Curingão. Já o reconhecimento se deu através de fotografias apresentadas ao caminhoneiro.Configurada a transgressão ao artigo 316 do Código Penal Brasileiro (crime de concussão), Marco Aurélio teve a destituição confirmada pela Justiça Federal, consumando-se o seu desligamento definitivo da PRF. Tal ratificação judicial é imprescindível para romper o, digamos, contrato do servidor público, uma vez que o seu estatuto consagra dispositivos legais ultrapassados e, ao mesmo tempo pétreos, que garantem um vínculo praticamente indissolúvel.
O juiz federal que exarou a sentença, tocou na grave carência brasileira: “A aplicação dessa penalidade acessória [prisão + exoneração] justifica-se em razão do desprestígio que gera para a corporação da Polícia Rodoviária Federal manter em seus quadros de servidores e autoridades, pessoas que violam os deveres de honestidade e moralidade no exercício do cargo”. A pena de Marco Aurélio foi de três anos e dois meses de detenção, convertidos em serviços a comunidades ou a entidades públicas.
Além disso, coube-lhe multa no valor de dez salários mínimos. Paralelamente, corre na Justiça Federal processo contra dois outros agentes da PRF, igualmente acusados de cobrar propina de motoristas nas BRs mineiras. O fato suspeito ocorreu na barreira de Betim (MG), km 499 da Fernão Dias (BR-381). Eles exigiram R$ 100 para liberarem um ônibus clandestino. A corregedoria já estava vigiando um deles e flagrou o tropeço. O processo ainda vai longe, acolhendo os recursos. Na ocasião, o motorista do ônibus também foi preso, acusado de corrupção ativa.