É o que consta do Marco Regulatório do Transporte Rodoviário de Carga, lei já aprovada na Câmara Federal mas que ainda precisa ser votada no Senado
Nelson Bortolin e Cláudia Albuquerque
O projeto de lei 4.860/16, que estabelece a futura lei chamada de Marco Regulatório do Transporte Rodoviário de Carga, poderá voltar a permitir que os bitrens de sete eixos sejam tracionados por cavalos 6×2. É o que consta no texto, aprovado no ano passado pela Câmara dos Deputados mas que ainda precisa ser votado pelo Senado. Não há prazo previsto para que isso aconteça.
A medida é polêmica: transportadores, principalmente no segmento de grãos, gostariam que os cavalos 6×2 fossem autorizados de novo a puxar bitrens, mas técnicos do setor são contra.
Desde janeiro de 2011, por determinação do Contran, bitrens novos só podem ser tracionados por cavalos 6×4. “Voltar a permitir será, de fato, um retrocesso”, afirma o engenheiro mecânico Rubem Penteado de Melo, da TRS Engenharia, de Curitiba. “Os bitrens, quando puxados por 6×2, causam graves deformações no asfalto. Quando o motorista troca de marcha, a tração patina e empurra o asfalto para o lado”, explica Melo. “Com o cavalo 6×4, não ocorre esse ‘enrugamento’ do asfalto”, completa.
Sua opinião é avalizada por Neuto Gonçalves dos Reis, diretor técnico da NTC&Logística e membro da Câmara Temática de Assuntos Veiculares do Contran. “O 6×4 é muito mais seguro e menos danoso ao pavimento. Ele evita a patinação e distribui melhor a carga nos eixos. Já o 6×2, puxando bitrens, abre trilhas no asfalto, ou seja, reduz a vida do pavimento e aumenta o risco de acidentes”, diz ele.
EFEITO NULO – Já o presidente do G10 – grupo de transporte de grãos de Maringá –, Cláudio Adamuccio, acha que, se o problema é a conservação do asfalto, as normas do Contran que obrigaram a tração 6×4 nos bitrens de sete eixos não surtiram efeito. Isso porque, segundo ele, os transportadores preferiram substituir essas configurações por outros tipos de composições não muito amigáveis com o pavimento, como os bitrens de nove eixos (74 toneladas), os 8×2 com carreta LS (54,5 toneladas) e as carretas com eixos distanciados (53 toneladas).
“Então, o efeito da lei foi nulo”, diz ele. Adamuccio esclarece, também, que não é a diferença de preço entre um cavalo 6×2 e um 6×4 – “em média R$ 18 mil” – que fez os frotistas deixarem o bitrem de lado. “O transportador não gosta dos 6×4 porque pesam 800 quilos a mais e consomem mais 3% de diesel. É uma diferença muito grande.”
Montadoras são contra
As montadoras estão com os técnicos: são contra o uso de cavalos 6×2 para tracionar bitrens de sete eixos; defendem os 6×4. Para o gerente de desenvolvimento de negócios da Scania, Celso Mendonça, a mudança que entrou em vigor em 2011 levou em conta a segurança e a manutenção do pavimento. “Foi uma decisão baseada em estudos. Já a defesa da volta do 6×2 é baseada em coisa nenhuma. Nesse assunto, devem ser considerados os aspectos técnicos.” Ele ressalta que os caminhões estão cada vez mais potentes, com velocidades médias altas. “A volta do 6×2 para bitrens aumentaria o risco de acidentes”, diz. E lembra que na versão 6×2 há menos eixos freando no conjunto, sendo possível levantar três eixos. “Ou seja, são menos eixos para ajudar a segurar o veículo no solo.”
O diretor comercial de caminhões da Volvo no Brasil, Bernardo Fedalto, também é contra a volta dos 6×2. “A regulamentação do cavalo 6×4 para puxar bitrens foi uma evolução”, diz ele. “Com quatro pontos tracionando, o veículo oferece mais segurança e menos impacto ao asfalto.” Fedalto argumenta que os defensores da volta dos 6×2, através da futura Lei do Marco Regulatório, “não têm uma base que justifique a mudança e informe quais seriam seus benefícios”.
“Retrocesso” também é a palavra usada pelo diretor comercial da DAF, Luís Antonio Gambim, para definir a intenção de liberar o 6×2 no bitrem. “Somos contra por motivos de segurança. E não temos dúvida de que o 6×2 no bitrem piora o pavimento, que, no Brasil, de forma geral, tem baixa qualidade.” Para Gambim, uma medida dessas aumenta gastos com a manutenção de estradas. “Aí todo o mundo sai perdendo”, avalia.
“RADICAIS” – Palavras do deputado Nelson Marquezelli (PTB/SP): “Os técnicos são radicais, não têm vivência no setor e, se depender deles, não se acopla nem reboque no caminhão”. Assim Marquezelli justificou o fato de o Contran não ter sido chamado à Câmara para o debate que antecedeu a aprovação do projeto de lei do Marco Regulatório. Marquezelli é conhecido como defensor de medidas, no transporte, que reduzam os custos dos produtos agrícolas.