A Revista Carga Pesada comemora três décadas e meia superando desafios para levar informação séria e independente aos seus leitores

NELSON BORTOLIN

Resistência, resiliência, persistência. Algumas das características que marcam o transporte rodoviário de carga no País também servem para retratar a comunicação dirigida ao setor.

Há exatos 35 anos, publicamos nosso primeiro número, ainda com o nome de Jornal do Caminhoneiro. Pouco tempo depois, viramos revista, com papel brilhante e páginas coloridas.

Nossa história é marcada por muitas conquistas e alegrias. Mas também pela superação. Para chegarmos até aqui, superamos várias crises econômicas e do mercado editorial. Foram muitos os desafios que tivemos de enfrentar para continuarmos na estrada.

Assim como os demais veículos de comunicação, sofremos pelas incertezas que as novas tecnologias impõem. Tivemos de nos reinventar para continuar nossa viagem. Fomos a primeira publicação voltada ao setor de transporte a entrar na internet. Nosso site, o www.cargapesada.com.br, foi ao ar em janeiro de 1997, quando a rede mundial de computadores estava começando a se popularizar no Brasil.

Acompanhamos todas as greves dos caminhoneiros, como a de 1999 (abaixo) e a de maio de 2018 (acima)

Até então, só havia duas formas de os leitores receberem nossas notícias: pelos Correios ou pegando a revista nos postos de combustíveis. Para fazermos nossas entrevistas, só pessoalmente ou por telefone. Nas estradas, os caminhoneiros se comunicavam por rádio PX. Para falar com as famílias, usavam os orelhões quando havia nas paradas.

A tecnologia avançou muito rápido. E, com ela, as ameaças ao jornalismo impresso. Desde os anos 1990, teóricos do mundo todo pregam o fim da comunicação por meio de papel. Não aconteceu naquela década.
No início dos anos 2000, Steve Jobs mostrou ao mundo os primeiros tablets. Em pouco tempo, todo o mundo passaria a ler livros e jornais nas telas desses equipamentos. De fato, muitas publicações fecharam as portas, mas a informação continua circulando no papel em veículos de todo o mundo. Nós somos um deles.

Continuamos vivos e impressos. Mas abraçamos todas as novas mídias digitais que foram surgindo ano a ano.

Antigamente, para ter suas opiniões registradas na Revista Carga Pesada, nossos leitores tinham de preencher a carta-resposta inserida em cada exemplar da revista, colocar nos Correios e aguardar que sua participação fosse publicada na seção de cartas da edição seguinte. Hoje, os leitores comentam nossas reportagens a hora que quiserem, seja pelo site ou pelas redes sociais.

Entre eles, há aqueles que não perdem o hábito de folhear e confiam mais quando as informações se apresentam no papel. Mas também os que só se interessam por ler na tela do computador ou do celular.
Presente desde sempre nas nossas publicações, o presidente do Sindicato dos Caminhoneiros (Sindicam) de São Paulo, Norival Almeida Silva, acredita que os veículos impressos vão sobreviver porque perenizam a informação. “A revista está guardada ali no cantinho. De vez em quando, a gente vai lá e pega uma informação para trabalhar num projeto da gente”, afirma.

Já nas mídias digitais, na opinião dele, a informação é como “fogo de palha”, “aparece e logo se apaga”. “Como um post pode ter um milhão de visualizações e a revista vai ter lá seus 50 mil exemplares, as pessoas acham que é melhor usar o digital.”

Apoiamos desde sempre a participação das mulheres na boleia, como a da Sheila Marchiori, capa em agosto de 2016

Mas, segundo o presidente do sindicato, há muita informação “sem nexo” e “fora da realidade” nas redes sociais. “Eu confio muito mais nas impressas que nas digitais.”

O empresário Cláudio Adamuccio, presidente da Transpanorama e do G10, de Maringá (PR), tem opinião parecida com a de Norival. “Hoje, há muitos sites e blogs. Há excesso de canais de comunicação. Mas os que oferecem mais credibilidade são os que ainda mantêm publicação impressa”, avalia.

Ele diz conversar com amigos empresários que também não dispensam o papel. “Apesar de todos os canais digitais, ainda mantêm o hábito de abrir o jornal toda manhã.”

O empresário não renega as novas mídias. “Sei da importância, da velocidade, da versatilidade delas. A qualquer minuto as informações estão disponíveis. Eu não dispenso nenhuma das duas, mas confio mais na mídia impressa.”

Leitor fiel e o mais participativo nas redes sociais da Revista Carga Pesada, o mineiro Wellington da Torre, o Zé Cueca, pensa o oposto. “Tomei repulsa por jornal escrito e por muitos canais de comunicação que mentem, enganam e acabam levando as pessoas a fazer o que eles mandam. São dinossauros que falam a mesma língua. Parece que tudo é combinado antes de eles chegarem às bancas”, critica. “A mentira repetida várias vezes se torna uma verdade”, complementa.

Acompanhamos e divulgamos todas as inovações na indústria, como o recente lançamento do primeiro caminhão sem retrovisor

A principal diferença entre mídia digital e impressa, para ele, é que a primeira permite a participação do leitor. “Temos mais oportunidades de questionar, o que é dificultado pelo impresso. O impresso nunca dá oportunidade ao contraditório”, declara.

Já para o ex-caminhoneiro gaúcho e hoje organizador de um livro que vai tratar da história do transporte de carga, Dsqui Pontes, a mídia impressa está com os dias contados, por ser “mais cara e nem sempre acessível”.

Especificamente no setor de transporte, ele avalia que a informação impressa fazia sentido quando o caminhoneiro usava PX e orelhão de posto de combustível para se comunicar. “Naquela época, as revistas impressas tinham uma importância enorme na divulgação de informações úteis para a categoria. Hoje, todo caminhoneiro tem um celular e está ligado a uma rede social, se informando o tempo todo”, justifica.

Dsqui Pontes com sua coleção de revistas Carga Pesada e o filho João Gabriel

O profissional da boleia, na visão de Pontes, é mais informado hoje e quer participar dando sua opinião. “E já não basta saber sobre caminhões, novidades, lançamentos. Atualmente, o caminhoneiro quer se informar sobre tudo que tenha impacto na sua vida, como política, economia, legislação.”

DIRIGIDA – A reportagem quis saber dos leitores o que eles acham dos veículos de comunicação dirigidos do setor de transporte. Zé Cueca diz que alguns fazem a diferença, entre eles a Revista Carga Pesada. “Mas sinto que alguns estão exclusivamente a serviço do poder, ainda não estão totalmente alinhados com a realidade do caminhoneiro, principalmente o autônomo”, critica. “Claro que existem as exceções, como é o caso da Carga Pesada, que nos ouve e corajosamente publica nossos comentários nesses 35 anos de sua existência”, elogia.

Ele é ainda mais crítico aos grandes veículos não especializados. “Com raras exceções, divulgam matérias para nos enganar. Eu costumo dizer que, se a emissora tal me manda ir para a rua, fico dentro de casa. E se ela manda ficar dentro de casa, eu corro para a rua”, brinca.

Ficamos encantados com as vitórias dos nossos leitores, como a do Luís Carlos, que foi capa da revista por ter vencido em 2016 uma competição de motoristas da América Latina

Para Norival Almeida Silva, só a imprensa especializada “mostra a realidade do setor, do dia a dia do caminhoneiro”. “Poucos veículos fazem isso, tratam da situação dos caminhoneiros e das rodovias. E temos poucas revistas de transporte”, alega.

O empresário Cláudio Adamuccio sai em defesa da imprensa especializada. “Assim como um médico ou advogado deve se especializar, o jornalista também.” Ele conta que concede “de três a quatro” entrevistas por dia. E percebe que as perguntas dos jornalistas de órgãos dirigidos, como a Revista Carga Pesada, são mais bem direcionadas. “Eles têm mais conhecimento do assunto e sabem, portanto, explorar melhor esse assunto. Quando a pergunta não é bem direcionada, a resposta também não é dada da maneira adequada.”

A caminhoneira paranaense Marlene Heinen

A caminhoneira Marlene Heinen, da cidade de Planalto, no Paraná, é também uma leitora fiel da Revista Carga Pesada. Na opinião dela, a evolução da mídia é importante para permitir que todos tenham acesso à informação. “Com seu senso crítico, a mídia facilita o entendimento de temas polêmicos e difíceis que afetam nosso negócio na estrada”, avalia.
Além de atualizar seu público, Marlene acredita que a Revista Carga Pesada incentiva os leitores a refletirem sobre os assuntos mais relevantes da política, da economia e também os sociais. “E para nós caminhoneiros é uma companheira de viagem. Obrigada por poder compartilhar dessa linda histórica de sucesso da Carga Pesada.”