Defasagem no frete de grãos é de quase 40%
Essa conta considera só os custos, sem o lucro, segundo a NTC&Logística. E o lucro é um direito. Numa reunião realizada em Maringá (PR), transportadores analisaram a difícil situação do setor
Nelson Bortolin
O frete rodoviário de grãos está defasado em pelo menos 39%, só para empatar com o custo. A conta foi feita pelo engenheiro Antonio Lauro Valdívia Neto, do Departamento de Custos Operacionais, Estudos Técnicos e Econômicos (Decope) da NTC&Logística, e apresentada por ele a transportadores paranaenses numa palestra realizada em Maringá, no dia 17 de agosto.
Segundo Valdívia Neto, uma viagem de ida e volta de um bitrem carregado com 37 toneladas de grãos de Maringá até o Porto de Paranaguá custa em torno de R$ 7.620, sem lucro algum. Mas o que tem sido oferecido aos transportadores não passa de R$ 4.625. A diferença exata é de 39,3%.
O cálculo feito pelo engenheiro leva em conta um tempo parado de um dia para carregamento e um dia para descarregamento. Se fosse metade do tempo, o custo cairia 30% – ficaria em R$ 5.288. “O transporte no País é encarecido pela falta de infraestrutura nas empresas e nos portos. O veículo trabalha com tempo. Se fica parado na carga e descarga, esse é um tempo desperdiçado que tem alto custo”, ressalta.
De acordo com Valdívia Neto, o transporte de grãos sofre mais que os outros segmentos com o baixo frete porque tem muita concorrência. “É uma área fácil de entrar. Não tem barreiras. Quando um outro setor está ruim, o transportador vai carregar grãos. Quando o frete de grãos está bom, muitos são atraídos e abandonam o setor em que trabalhavam.”
O coordenador da Câmara de Agronegócios da NTC&Logística, Geasi Oliveira, admite que os transportadores de grãos não têm “cultura de fazer contas”. “Calculamos o combustível, os pneus, o salário do motorista, mas deixamos de lado outros custos que parecem invisíveis, mas são reais”, afirmou. A depreciação da frota, por exemplo, é um custo que não costuma aparecer nas planilhas das empresas, segundo ele.
Sem incluir todos os custos na planilha, as empresas estão fadadas a fechar suas portas em médio prazo, segundo o engenheiro Valdívia Neto. Mas também é difícil conseguir quem pague o preço justo, ele reconhece. “O problema é que a cadeia de transporte rodoviário de carga no Brasil é complexa e os clientes sempre conseguem encontrar quem faça o frete mais barato. Os embarcadores espremem as empresas de transporte. Se elas se recusam a fazer um valor mais baixo, eles procuram os motoristas autônomos. Sempre tem alguém que aceita”, salienta.
Cenário difícil
A reportagem perguntou ao presidente do Sindicato das Empresas de Transporte do Oeste do Paraná (Sintropar), Luís Carlos Zanella, como as empresas estão sobrevivendo com uma defasagem tão grande no frete. Ele disse que muitas estão quebrando. “São aquelas que olham só o custo imediato e, quando se dão conta do restante, entram em dificuldade e fecham as portas.”
Algumas empresas, segundo Zanella, fazem manobras fiscais e colocam os motoristas para trabalhar além do limite legal para fecharem as contas. Pesquisa recente da NTC&Logística apontou que metade das transportadoras está com impostos atrasados.
“Na verdade, nós estamos sobrevivendo de crédito bancário”, afirma o presidente da Associação das Transportadoras de Maringá (Atromar), Reinaldo Muniz de Souza, também consultado pela Carga Pesada. “Quem tem nome, está sobrevivendo assim. Posso garantir que todas as empresas da minha associação (são 22) estão vivendo de crédito.” Ele diz que as empresas ligadas à entidade não estão carregando carga além do limite para compensar o frete ruim, mas admite que os motoristas estão tendo de trabalhar mais.
Sérgio Shiraisha, diretor da TDL Transporte, de Maringá, acrescenta que as empresas estão “se segurando como podem”. “Existe demanda, mas os custos subiram. Estamos tentando segurar ao máximo para sobreviver.” Para ele, a principal razão dos fretes baixos é o excesso de oferta de caminhões. “Foi uma falha do governo, que liberou muito crédito e propiciou a compra de uma frota acima da necessidade do País.”
Questionado sobre perspectivas de melhoras para os próximos meses, Shiraisha responde: “Só tenho boas expectativas para os próximos anos. Conversando com gente de bancos, montadoras, noto que as esperanças são para 2019. Tem gente falando em 2020… Nosso dilema é conseguir sobreviver até lá”, declara.
Nova tabela
A reunião de Maringá serviu para o engenheiro Antonio Lauro Valdívia Neto coletar dados para atualização da tabela referencial do segmento feita há dois anos. A diferença de 39% entre o custo do transporte e o valor que anda sendo pago por aí, colocada no título desta reportagem, foi calculada com base na tabela antiga. A nova ficará pronta logo. Geasi Oliveira, que também é superintendente do Sindicato das Empresas de Transporte de Carga de Maringá, o Setcamar, afirma que será feita uma ampla divulgação da nova tabela, “para que os transportadores tenham consciência da situação que estamos vivendo e tomem as precauções que estiverem ao seu alcance para não fechar as portas”.