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Acordo na Justiça pode pôr fim à lista suja

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Gerenciadora de risco de Minas Gerais aceitou parar de investigar e divulgar informações da vida privada dos motoristas para se livrar de acusação de discriminação do Ministério Público

Guto Rocha

Um acordo entre o Ministério Público do Trabalho de Minas Gerais e a empresa Gertran – Gerenciamento de Riscos, de Belo Horizonte (MG), pode abrir caminho para acabar com um problema que tem dificultado e até impedido o trabalho de caminhoneiros em todo o País: a divulgação de dados sigilosos que constam nas chamadas listas sujas. Pelo acordo, a empresa se comprometeu, sob pena de multa, a não investigar e divulgar dados da vida privada e íntima dos motoristas, impedindo-os de trabalhar.

Em 2007, o Sindicam-SP entrou com uma denúncia no Ministério Público do Trabalho de São Paulo contra empresas gerenciadoras de risco que bloqueiam o nome dos motoristas que apresentam alguma pendência com Serasa, SPC, Cartórios de Protestos, Fisco, Polícia e Poder Judiciário.

O caso chegou a Minas porque uma das empresas, a Gertran, era mineira. A Procuradoria Regional do Trabalho de Belo Horizonte ingressou com uma ação civil pública contra ela.

Procuradora Ana Cláudia Gomes: a prova estava no site

Para a procuradora do Trabalho da 3ª Região, Ana Cláudia Nascimento Gomes, o que a empresa fazia era discriminação. “Foi fácil encontrar a prova da ilegalidade porque a empresa reconhecia em seu próprio site que tinha (a lista suja) como um serviço para o público”, conta a procuradora.

Ana Cláudia explica que, segundo a CLT (lei trabalhista) e a Constituição, qualquer pessoa é livre para trabalhar se tiver a qualificação exigida por lei para aquela atividade. “Mais do que isso configura uma exigência desproporcional e pode ser entendido como discriminação”, diz.

Segundo a procuradora, a Gertran tinha um cadastro com 30 mil motoristas, e cerca de 30% deles estavam negativados por conta de débitos. “Mas só um caso apresentava antecedentes criminais”, observa. Por isso, destaca a promotora, o acordo prevê que a pesquisa criminal continue. “Apesar de que a pessoa que esteja condenada ou sentenciada não pode perder seus direitos de trabalhador”, comenta.

A pena para o descumprimento do acordo é uma multa de R$ 50 mil para cada dado que a Gertran divulgar.
Para o presidente do Sindicam-SP, Norival de Almeida Silva, o acordo obtido em Minas Gerais foi uma vitória. “Não é papel das gerenciadoras de risco fazer o trabalho de cobrança de cheques sem fundo ou de IPTU atrasado.”

Segundo Silva, o Sindicam-SP tem um processo na Justiça contra 52 gerenciadoras de risco. Em sua avaliação, o acordo de Minas pode abrir espaço para novas conquistas do gênero.

Waldir passou apertado

O atraso de algumas prestações de uma Belina fez com que o caminhoneiro Waldir Martins, de São Paulo, virasse mau pagador no Serasa. “Atrasei depois que o carro foi roubado”, conta. Somado a isso, Martins teve problemas de pontuação em sua CNH, segundo ele, “por causa de um amigo”. Resultado: seu nome foi bloqueado por uma gerenciadora de risco.

Acontece que Martins havia assumido, em setembro do ano passado, uma dívida relativa à compra de um Volvo NL 10, ano 1988. “Como fiquei mais de um mês sem trabalho por causa do bloqueio, também não deu pra pagar as prestações do caminhão”, informa.

Ele está com cinco parcelas em atraso. “Estou renegociando o financiamento com o banco. Não posso perder o caminhão, ele é o meu ganha-pão”, diz.

O caminhoneiro conta que teve prejuízos entre R$ 5 mil e R$ 6 mil no período em que ficou bloqueado. “Para não passar necessidade, tive de ajudar minha mulher a vender salgadinhos.”

Para gerenciador, só há cadastro “positivo”

Cyro Buonavoglia: os métodos mudaram

Para o presidente da Gristec (Associação Brasileira das Empresas de Gerenciamento de Riscos e de Tecnologia de Rastreamento e Monitoramento) e do Sindirisco, Cyro Buonavoglia, há “um equívoco” nessa história de que “lista suja” impede caminhoneiros de conseguir trabalho. “O que existe é um cadastro de motoristas para garantir segurança para as empresas que contratam os transportadores”, afirma.

Segundo ele, o cadastro das gerenciadoras é “positivo”, avalia a situação da CNH do motorista, o grau de experiência, se ele está apto para transportar certo tipo de carga e também as condições do caminhão.

Buonavoglia afirma que o cadastro não tem intenção de tirar a oportunidade de trabalho de motoristas que agem corretamente. “Ninguém fica sem trabalho por causa de um cheque sem fundos. Mas temos que ser coerentes: se um motorista ganha R$ 3 mil por mês e tem R$ 8 mil em cheques sem fundo, é uma coisa; agora, se ele tem R$ 56 mil em cheques descobertos, podemos concluir que está mal-intencionado”, acredita.

O presidente da Gristec reconhece que houve época em que empresas do setor “podem ter cometido algum erro” ao avaliar a situação do motorista, “mas os métodos mudaram”: “A nossa missão é muito maior do que dizer se um motorista pode transportar ou não”.

Quanto ao caso de Belo Horizonte, Buonavoglia acredita que houve um erro de interpretação da matéria. “O Ministério Público só ficou sabendo meias-verdades”, comenta. Ele afirma que, em São Paulo, várias ações movidas contra gerenciadoras de risco acabaram arquivadas. “Acredito que a Gertran teve de fazer o acordo porque estava mal-assessorada juridicamente”, diz.

Procurado pela reportagem, o diretor da Gertran, Sérgio Luis Alves Pereira, não quis se manifestar.

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