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“É melhor caminhoneiro na fila do que rodando com sono”

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São palavras do procurador do Ministério Público do Trabalho em Rondonópolis, que não alivia: quer porque quer o controle da jornada de trabalho dos motoristas

Nelson Bortolin

O procurador do Ministério Público do Trabalho de Rondonópolis (MT), Paulo Douglas Almeida de Moraes, não está disposto a defender os transportadores na questão das péssimas condições para os motoristas nos terminais da ALL em Alto Taquari e Alto Araguaia, se as empresas de transporte não quiserem negociar a redução do tempo que os motoristas são obrigados a ficar no volante.

Foi ele que, no início de 2008, entrou com a ação judicial que resultou numa liminar exigindo que os motoristas tivessem uma jornada de trabalho igual à de outro empregado qualquer: oito horas e máximo de duas horas extras por dia. A liminar foi cassada dias depois.

Para o procurador, os motoristas trabalham demais e usam drogas para aguentar o esforço, arriscando a saúde e ameaçando a segurança dos outros. Ele mesmo fez duas pesquisas, em 2007, em parceria com a Polícia Rodoviária Federal e laboratórios médicos, e comprovou isso.

Na primeira, em Rondonópolis, em 104 amostras de urina de motoristas que se dispuseram a participar, o laboratório encontrou 3% de positivo para cocaína e 8% para anfetaminas (rebite). Nas entrevistas, porém, o procurador concluiu que 30% dos caminhoneiros faziam uso de drogas. E 31% trabalhavam mais de 16 horas por dia!

Na segunda pesquisa, em Diamantino (MT), foram coletadas 103 amostras de urina – e o resultado impressionou o procurador. O positivo para cocaína foi de 15%, cinco vezes mais que na anterior (veja quadro). Para Moraes, foi a melhor divulgação do objetivo do trabalho (dar base a uma ação judicial pela redução da jornada de trabalho) que encorajou os motoristas a colaborar. “Garantíamos o sigilo, como na primeira, mas tivemos mais facilidade em obter adesões”, diz ele.

Associando essas informações com o problema dos terminais da ALL, o procurador afirma: “De certa forma, é melhor que o motorista fique parado na fila do que rodando com sono. Precisamos controlar a jornada de trabalho. Temos enterrado motoristas de caminhão todos os dias e eles enterram outros usuários de rodovias”.

“Pagamento em forma de comissão faz o motorista ir ao limite da exaustão e recorrer às drogas”, diz o procurador Moraes

Para ele, a conversa dos empresários do transporte de que estão preocupados com o bem-estar do trabalhador (nos terminais da ALL) mostrou-se “falaciosa” (mentirosa) quando eles foram à Justiça derrubar a liminar que obrigava a controlar a jornada de trabalho.

Naquela ocasião, os próprios motoristas protestaram contra a liminar. O procurador diz que isso se deveu “à ignorância do empregado sobre seus direitos legais” e ao fato de que as empresas pagam a maior parte dos ganhos do motorista em forma de comissão e não de salário fixo. “Assim o motorista é induzido a se degradar no trabalho até o limite da exaustão e a recorrer às drogas.” E o pior é que o ganho com comissões não conta na hora da aposentadoria ou na pensão de uma viúva, lembra o procurador. “Quando ele morre ou é encostado, a pensão ou aposentadoria é miserável, e o esforço revela-se inútil.”

Para Moraes, o controle de jornada levaria à abertura de novas vagas, obrigaria as empresas a pagar melhores salários, mas elas ganhariam elevando os fretes. “A própria CNT diz que no Brasil o frete rodoviário é tão baixo que chega a inviabilizar os outros modais”, lembra.

O procurador diz que notou, em suas pesquisas, que o autônomo trabalha menos e descansa mais. “Eu achava que não, mas percebi que o autônomo até aceita a ideia de se submeter ao controle do tempo de direção, porque ele já se autocontrola e consegue obter uma renda que garante qualidade de vida para sua família.” Mas as regras valeriam também para os autônomos.

Procurador está equivocado, na opinião

Reprodução de vídeo mostra caminhoneiro sendo multado enquanto estava na fila

O diretor executivo da Associação dos Transportadores de Carga (ATC), de Rondonópolis, Miguel Mendes, critica a postura do procurador. Para ele, Moraes está fugindo de suas obrigações ao deixar de fiscalizar os terminais da ALL. “Além disso, ele está equivocado quando fala que prefere o motorista descansando na fila. Fila não é descanso, é expectativa permanente de ser chamado. Aí sim ele é obrigado a usar estimulante para poder retomar a viagem.”

Para o diretor, o procurador desconhece a realidade do caminhoneiro, quando diz que ele passa muito tempo ao volante. “O motorista fica a maior parte do tempo em fila.”

Mendes considera inviável querer que um motorista faça uma jornada de trabalho igual à dos outros trabalhadores. “É muito diferente. Você até faz um planejamento de viagem, mas o caminhoneiro está à mercê do clima, das filas…” E questiona: “Imagine uma fila de cinco dias, como essas nos terminais da ALL. A empresa sem faturar e o motorista lá, ganhando hora extra todo esse tempo. Quem aguentaria?”

Mendes argumenta que os empresários não são irresponsáveis e não incentivam os motoristas a dirigirem à exaustão. Ele defende o projeto de lei 2.660, que tramita há 12 anos no Congresso. Pela proposta, o caminhoneiro tem de repousar 10 horas ininterruptas entre uma jornada e outra e descansar meia hora a cada quatro trabalhadas.

Diumar Bueno, presidente do Sindicam-PR e da Fenacam, também defende o projeto de lei 2.660. “Somos favoráveis ao controle da jornada de trabalho tanto para o autônomo quanto para o empregado. Sabemos que há abusos.”

Para ele, no entanto, essa providência tem que ser precedida de outra: a construção de locais para estacionar. “O caminhoneiro não pode dormir no acostamento.”

Bueno disse que o assunto está sendo discutido num grupo de trabalho do qual ele faz parte na ANTT.

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