Luciano Alves Pereira
A história começa no Norte da Itália, onde nasceu Vitor, numa família de agricultores. Aos 12 anos já trabalhava como lenhador, próximo às cidades de Savona, Piemonte e Quiavenna. A 2ª Guerra Mundial o pegou na idade de servir no exército de Benito Mussolini. Foi uma época de grande padecimento para ele. Embora Mussolini estivesse ao lado de Hitler, com a derrota precoce da Itália para os aliados, parte dos soldados italianos foi recolhida pelos alemães a campos de concentração, onde Vitor viveu dois anos. Liberado, com o fim da guerra, decidiu embarcar para o Rio de Janeiro em 1946, como muitos europeus que estavam migrando para a América do Sul.
No Brasil, Vitor Bernadara empregou-se como faxineiro numa oficina mecânica de caminhões, em São Paulo. Logo virava motorista, não lhe faltando também o apoio dos conterrâneos, como os donos da Transportadora Tosk Bussotti. Seu objetivo era “adquirir o primeiro caminhão a ser pago com serviços”, como lembra. Para ele, tudo conseguido “graças à ajuda, compreensão e hospitalidade encontradas aqui”. Em pouco tempo começou a puxar gasolina para o aeroporto de Montes Claros (MG), a partir do Rio, e passou a contratado da Esso. Como estava sempre no trecho, Bernadara fez parte da falada turma de carreteiros de Matias Barbosa e Juiz de Fora, que viu o transporte prosperar a partir do asfaltamento da BR-3 (hoje, BR-040), em 1957. Foram profissionais que adotaram os FNMs ou Alfa Romeos, fabricados em Xerém, no pé da serra de Petrópolis (RJ). Esses estradianos fizeram história, com o uso pioneiro das composições romeu e julieta, apelidadas de ‘cobras’.
Em 41 anos de TRC, o caminhoneiro italiano tem muitos casos pra contar. Por exemplo, um ocorrido em 1965 ou 1966. Ele morava em Juiz de Fora e seu ‘carro de andar’ não era o inevitável Fusca. Tinha um Chevrolet Impala importado, ano 1962, de duas portas e motor de oito cilindros, que em poucas aceleradas marcava 150 no velocímetro. Uma máquina dessas, numa estrada vazia e recém-asfaltada, era um apelo ‘à disparada’.
Certa data, Bernadara trazia (de Juiz de Fora) o carona e amigo José de Paula, comerciante de caminhões. Pelo visto, este não sabia como Vitor dirigia. Quando ganhou a BR-3, o Impala ‘azulou’. No velocímetro, 150 era o mínimo. Zé de Paula ficou com os cabelos em pé e começou a implorar ao amigo motorista para diminuir. Este, por sua vez, se divertia com o sufoco do passageiro. Em menos de uma hora estavam em Conselheiro Lafaiete, mais da metade da viagem. Vendo sua ‘avó pela greta’, de Paula resolveu agir. Mesmo com o carro em movimento, correu o braço por baixo do painel, pegou a chave de ignição, torceu-a e veio com ela na mão. Imediatamente jogou-a o mais distante possível, no meio do mato. Desligado, Bernadara parou o carro no acostamento, às gargalhadas. É bom explicar que, naquela época, as chaves não trancavam o volante. Sem parar de rir e para surpresa do acompanhante, tirou a chave reserva do bolso e retomou a viagem. Mas chegaram a Belo Horizonte sãos e salvos. Sobrevivente, José de Paula embrenhou-se bem mais tarde na política e virou prefeito de cidade do Norte de Minas. Vitor Bernadara também deixou a lida com caminhões, em 2000. “Meus filhos não quiseram continuar no negócio”, explica. Por volta dos anos 1980, a sua transportadora Vitor Bernadara Ltda., de Betim, operou uma frota próxima de 50 conjuntos, predominando os cavalos-mecânicos da marca Fiat Diesel, antecessora da italiana Iveco. Sempre prestigiou as coisas da sua terra natal.