Uma vez rainha, sempre rainha. Aos 30 anos de carreira, a cantora Sula Miranda afirma sentir muito orgulho do título Rainha dos Caminhoneiros, que sempre foi seu. A história da artista está ligada à revista Carga Pesada. Conforme lembra a própria Sula, a revista foi uma das primeiras a divulgarem seu trabalho. Ainda no formato de jornal, a Carga Pesada publicou por cinco anos o “Cantinho da Sula”, com notícias dela.
Desta vez, convidamos leitores para ajudarem em uma entrevista com a cantora que, no ano passado, lançou seu 18º disco, com o título “Inabalável”, e acaba de publicar o livro “De rainha a serva de Deus”. Confira a seguir algumas respostas.
Nelson Bortolin
Eliardo Locatelli, caminhoneiro vencedor do concurso Melhor Motorista do Brasil, da Scania – O que significa para você ser considerada a Rainha dos Caminhoneiros em tempos em que nós estamos sendo tão desvalorizados como profissionais? Você sente orgulho deste posto?
Sim, eu sinto orgulho. Minha história está baseada no caminhoneiro. Se eu tenho projeção, devo isso ao título de Rainha dos Caminhoneiros. Foi uma música que me deu tudo isso. Eu me sinto privilegiada. O Brasil é um país que tem essa coisa de títulos: Rei do Futebol, Rainha dos Baixinhos… Eu represento um segmento. Poucos são escolhidos e quem é escolhido é para sempre. Não tem outro rei do futebol.
Luís Marson, gerente de Frota da Transportadora Falcão – Como aconteceu essa ligação de simpatia da Sula Miranda com os caminhoneiros?
Começou com a música Caminhoneiro do Amor, do meu primeiro disco, que conta a vida da esposa do caminhoneiro. Na música eu falo que estou em casa, esperando por ele, que quando ele chegar, a gente vai se amar. Isso pra mim foi muito positivo, porque eu entrei pela porta da frente. A esposa do caminhoneiro comprou o meu CD, tornou-se minha fã. Isso fez com que ele também gostasse de mim. Ela sabe que, quando ele me ouve, ele está pensando nela. A família do caminhoneiro me abraçou. Não sou musa porque sou sexy.
Marlene Heinen, caminhoneira paranaense – A gente se emociona ouvindo suas músicas. Você é filha de caminhoneiro?
Não. Mas eu vejo uma identificação entre a vida do artista e a do caminhoneiro, porque a nossa vida também é na estrada. Já fiquei 25 dias sem voltar para casa. Eu conheço a estrada esburacada e a comida ruim. Claro que, para os caminhoneiros, a situação é mais dura do que para mim. Por ter o título de rainha, eu procuro olhar tudo com os olhos do caminhoneiro. Ver os acidentes, os roubos de carga, o que eles passam. Tento vestir a camisa. E nesses 30 anos, as dificuldades cresceram para eles. Quando comecei não tinha tanto essa história de roubo de cargas e até de assassinato de caminhoneiros.
João Cavalheiro, do Sinditac de Guarapuava – Por que você desapareceu dos programas de caminhoneiros?
Tive um período em que parei de cantar, me dediquei mais ao trabalho de apresentadora de programas femininos. Hoje, faltam oportunidades, os programas de caminhoneiros não me chamam mais. Faz mais de cinco anos que trabalho num projeto para caminhoneiros. É um projeto audacioso, demorado, que requer investimento, depende de outras pessoas. Esse projeto se chama Pacam – ponto de apoio ao caminhoneiro. É para construir espaços voltados a eles na estrada, locais cercados, com segurança, banheiro bom, comida boa. Baseia-se no que existe em Iowa, nos Estados Unidos. Hoje tem a lei dos PPDs (Pontos de Parada e Descanso). Eu quero que o Pacam seja um PPD, seja uma casa do caminhoneiro. É um sonho, requer muito trabalho. Mas sei que vou conseguir. Busco parcerias na iniciativa privada para isso. As pessoas dizem que eu faço isso para aparecer. Não é. É um reconhecimento ao trabalho do caminhoneiro.
Jorge Olegário, caminhoneiro de Caruaru (PE) – Gostaria que a Sula desse dicas de como os motoristas devem se apresentar nas empresas, nos postos de combustíveis, nos postos fiscais. Eu acho deplorável a maneira como eles se apresentam. Talvez, partindo de uma pessoa do meio artístico, surta algum efeito.
Isso é uma questão muito pessoal, é uma coisa cultural. Vamos fazer um paralelo com a situação dos taxistas. Por que o Uber faz tanto sucesso hoje? Porque trabalha num novo conceito, o de servir melhor o cliente, de estar bem-vestido, de saber conversar e tal. Hoje, os taxistas estão tendo que se capacitar para poder ganhar serviço, porque perderam para alguém que chegou e procurou fazer o serviço de outra forma. No caso dos caminhoneiros, poderia ser diferente? Acho que a nova geração talvez tenha uma consciência maior. Há muitos anos, vi uma matéria no jornal que falava que eles eram executivos de chinelo de dedo, porque movimentam um patrimônio grande, mas andam malvestidos. Mas temos que ver que eles têm de carregar e descarregar. Eles podem estar mais bem-vestidos? Talvez. Aí entra a necessidade de que eu falei. Se o motorista tivesse um lugar digno nos postos de parada, será que ele não andaria mais apresentável? Mas ele para num lugar e não tem sequer um banheiro decente para tomar banho. Chega um momento em que uma coisa leva a outra. Ele não tem um lugar digno, por que vai andar com uma roupa boa? Fica desestimulado.
Carga Pesada – O que você acha das mulheres que abraçam a profissão de caminhoneira?
São guerreiras, gostam de fazer as coisas benfeitas. Nós estamos chegando a todos os lugares. Fico orgulhosa de ver que elas estão fazendo um excelente trabalho nas estradas. Torço para que mais mulheres possam se capacitar e ir para as estradas porque, assim, a gente vai ganhar um trânsito melhor. As mulheres são muito eficientes e cuidadosas em tudo o que fazem.
Carga Pesada – Ao recordar o início da sua carreira, o que você tem vontade de dizer?
Devo fazer um agradecimento especial à revista Carga Pesada, que faz parte da minha história. Acho que uma das primeiras revista para as quais eu fotografei. Foi um marco. A revista me abriu as portas, sempre divulgou o meu trabalho. Vocês são um capítulo na minha história.