Transportadoras sofrem retração nas operações e temem ter de fazer demissões
Nelson Bortolin
A tarifa de 50% anunciada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre uma série de produtos brasileiros começa a provocar efeitos imediatos sobre o transporte rodoviário e a cadeia exportadora do Paraná. Um dos setores mais atingidos é o madeireiro, que responde por cerca de 30% do faturamento da Rodonery Transportes, sediada em Paranaguá.
“O mercado ficou muito receoso desde o anúncio. Há medo de a carga chegar aos Estados Unidos e ficar presa na Alfândega ou ter que pagar a taxa de 50%”, explica o diretor de Negócios da Rodonery, Luiz Gustavo Nery. Segundo ele, o impacto atinge especialmente os embarques de madeira e carne — produtos que não entraram na lista de exceções divulgada pelo governo norte-americano.
Metade da exportação de madeira para os EUA parou
Na Rodonery, metade da madeira destinada ao exterior tem como destino os Estados Unidos. A retração já é sentida. “Nós tivemos uma queda de quase 50% na movimentação normal de madeira nas últimas semanas, muito em função dessa situação”, afirma Nery.
O executivo relata que a incerteza levou muitos clientes a suspender embarques. “Alguns tipos de madeira tropical ficaram fora da tarifa, mas há questionamentos sobre madeira serrada e compensada. Enquanto não houver um posicionamento claro dos Estados Unidos ou da Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processada Mecanicamente (Abimci), os exportadores preferem segurar os envios.”
Impacto em viagens e empregos
A Rodonery movimenta cerca de 600 a 700 contêineres por mês. Desses, aproximadamente 30% são ligadas ao setor florestal. “Metade desse volume para os Estados Unidos já foi afetado, o que significa uma redução de cerca de 100 contêineres no mês”, calcula Nery.
Se a situação se prolongar, de acordo com ele, será inevitável rever o quadro. “Hoje, falamos em até um terço dos empregos diretos em risco na Rodonery, além de toda a cadeia de motoristas agregados e profissionais das madeireiras.”
Reflexos para todo o setor
Como diretor de Transporte de Contêineres e Portos do Sindicato das Empresas de Transporte de Carga do Paraná (Setcepar), Nery observa que o problema extrapola a realidade da Rodonery. “Há transportadoras que trabalham quase 100% com frigorificados e têm os Estados Unidos como principal destino. Para essas empresas, a situação é muito mais grave. Sem readequação imediata ou inclusão da carne na lista de exceções, veremos demissões em massa e até falências.”
Ele destaca que o impacto se estenderá a todo o mercado. “Transportadoras que perderem suas cargas principais vão disputar outros fretes, pressionando preços e aumentando a concorrência em segmentos que hoje não dependem da exportação. É um efeito cascata.”
Pressão por negociação
Segundo Nery, o setor produtivo está empenhado em tentar reverter a medida ou ampliar a lista de exceções. “É mais viável reverter a tarifa do que abrir novos mercados da noite para o dia. Muitas fábricas produzem para contratos específicos com importadores norte-americanos. Mudar isso leva tempo e investimento.”
Ele alerta que a pressão deve ser acompanhada de ação governamental. “O Setcepar está atento e buscando alternativas para minimizar os impactos, mas sabemos que a solução depende de negociações em nível federal. Sem uma decisão rápida, os próximos meses serão trágicos.”
O diretor reforça que a preocupação maior está na preservação de empregos e na saúde financeira das empresas. “O setor de transporte já vem enfrentando dificuldades há anos, com problemas de infraestrutura, pandemia, alta do diesel e desoneração da folha. Essa tarifa é mais um golpe forte. Precisamos de uma reação ágil para evitar prejuízos irreversíveis.”
Alívio com lista de exceções
Na West Cargo, empresa paulista especializada no transporte rodoviário de produtos de alto valor agregado para exportação e importação, o impacto do “tarifaço” imposto pelos Estados Unidos já foi mais preocupante. Parte das cargas movimentadas pela transportadora entrou na lista de exceção de 700 tens divulgada pelo governo norte-americano na semana passada. Para esses produtos, a tarifa continuará em 10%, a alíquota mínima determinada por Donald Trump.
De acordo com o diretor de Marketing da empresa, Luigi Rosolen, cerca de 12% das operações da West Cargo têm como destino os Estados Unidos. “No início, o tarifaço de 50% afetaria toda a carga que enviamos ao mercado norte-americano. Com as isenções, estimamos que apenas 4% das nossas operações serão impactadas”, afirma.
Apesar da redução do risco, a movimentação de caminhões da empresa já sofreu queda desde a última segunda-feira. Isso porque as cargas não teriam tempo hábil de chegar aos EUA antes do início da nova tarifa, que passou a valer a zero hora desta quarta-feira (6).
Para acelerar a chegada dos produtos, muitos clientes que tradicionalmente utilizavam o modal marítimo migraram para o transporte aéreo nas últimas semanas.
A West Cargo opera em todo o território nacional, transportando cargas de exportadores até portos e aeroportos, além de realizar o transporte de produtos importados até os compradores brasileiros. De acordo com Rosolen, a empresa conta com uma frota de aproximadamente 300 caminhões, que vão desde VUCs (veículos urbanos de carga) até pranchas para cargas superdimensionadas.
Sindicato manifesta preocupação
O Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região (Setcesp) divulgou nota expressando a preocupação do setor com o tarifaço. A empresa lembra que o TRC é responsável por quase 1 milhão de empregos formais no País e responde por cerca de 65% de toda a movimentação de cargas, incluindo grande parte das operações portuárias de exportação e importação.
“O enfraquecimento das relações comerciais com os Estados Unidos – um dos principais destinos das exportações brasileiras – tem efeito imediato sobre essas empresas, que enfrentam redução no volume de cargas, aumento dos custos operacionais com redirecionamento de rotas, e insegurança para planejar investimentos. A continuidade desse cenário coloca em risco milhares de postos de trabalho e a sustentabilidade das operações logísticas”, diz a nota.