Para Lauro Valdívia, painel é essencial para o planejamento logístico e pode orientar decisões de infraestrutura
Nelson Bortolin
Para o engenheiro Lauro Valdívia, consultor e estudioso do transporte rodoviário de cargas, o Painel de Movimentação de Cargas lançado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) representa um avanço significativo — e chega com anos de atraso. “A gente precisava disso já há muito tempo. São dados essenciais, inclusive para o governo. Com o painel, é possível saber de onde está saindo a carga, para onde está indo, em que período do ano há mais fluxo de caminhões e onde há menos. Isso é fundamental para planejar duplicações e novas rodovias”, avalia.
Planejamento e decisões mais inteligentes
Segundo Valdívia, o país historicamente toma decisões de infraestrutura apenas quando as rodovias congestionam, o que resulta em investimentos reativos, e não planejados. “O governo hoje só faz quando congestiona. O painel vai dar esse tipo de informação antes, permitindo agir de forma preventiva”, observa.
O engenheiro também destaca a utilidade prática do painel para o setor privado, especialmente na definição de locais para novas fábricas, terminais e centros de distribuição. “Quem vai montar uma fábrica precisa saber se a região tem carga de retorno, se há fluxo de caminhões. Eu mesmo já assessorei a Klabin, e a empresa faz esse tipo de levantamento manualmente, visitando a região para entender se é possível compor carga de ida e volta. Agora, com o painel, esse tipo de estudo pode ser feito com muito mais precisão e agilidade.”
Viagens vazias: problema antigo e persistente
Questionado sobre a possibilidade de a ferramenta ajudar a reduzir as viagens com caminhões vazios, Valdívia é cauteloso. “O sistema vai ajudar, mas não vai resolver. Se resolvesse, os aplicativos que existem hoje já teriam resolvido. Eles ajudam, mas o problema permanece.”
Ele lembra que, em pesquisa realizada no Estado de São Paulo há alguns anos, cerca de 40% das viagens eram feitas sem carga de retorno, mesmo em uma região economicamente densa. “Estamos falando de um estado que praticamente tem carga em todas as direções, e ainda assim o índice era alto. Então, o painel pode contribuir, mas não eliminar completamente o problema.”
Falta de identificação de carga é um desafio
Para o especialista, um dos principais pontos a aprimorar no painel é o nível de detalhamento das mercadorias transportadas. “Hoje o sistema consegue identificar apenas 28% das viagens com o tipo de carga. É pouco. Isso acontece porque os dados vêm do Manifesto Eletrônico, e para identificar o produto seria necessário cruzar o MDF-e com as notas fiscais eletrônicas”, explica.
Segundo ele, muitos transportadores registram apenas termos genéricos, como “carga geral”, o que inviabiliza análises mais precisas. “Quando se coloca ‘carga geral’, não há como saber o que realmente está sendo levado. Já em alguns casos mais específicos, o sistema consegue discriminar, e é daí que vêm esses 28% de identificação.”
Potencial para cruzar dados e ampliar transparência
Valdívia acredita que, à medida que o sistema evoluir, a ANTT poderá cruzar o painel com outras bases de dados, ampliando o potencial analítico. “No futuro, se cruzarem o MDF-e com a nota fiscal eletrônica da mercadoria, teremos uma quantidade de dados absurda. Vai ser possível saber o que se transporta, de onde, para onde e quanto isso movimenta em valor”, projeta.




